Redação e reprovação no Enem

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Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
A redação todo ano é destaque com as polêmicas de seus temas, que as vezes é bem escolhido e outras não

Entra ano, sai ano, o Enem continua fazendo histórias. Umas felizes, umas tristes, muitas frustrantes. A frustração maior é com a redação, responsável pela eliminação da maioria dos candidatos, o que bem demonstra a má qualidade do ensino da língua pátria nesta pátria nossa.

Comecemos com o primeiro Enem, de 1998, quando o tema de redação foi relativamente fácil: VIVER E APRENDER. Foi inspirado na canção O que é o que é, de Gonzaguinha, que dizia: Viver e não ter vergonha de ser feliz, cantar e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz. Quem neste mundo de meu Deus não saberia falar sobre isso, se todos sabemos que é vivendo que se aprende e é aprendendo que se vive? Mesmo assim, a redação reprovou milhares de candidatos.

No ano seguinte, o tema foi mais político, CIDADANIA E PARTICIPAÇÃO SOCIAL. Talvez tenha se inspirado na Constituição de 1988, que completava 11 anos de promulgação – ou de idade. Bastava ler o discurso do relator, o grande deputado Ulysses Guimarães, para alicerçar uma redação politicamente aceitável. A Carta Magna fora batizada por Ulysses de Constituição Cidadã. Era um bom caminho, mas parece que a maior parte dos candidatos não soube trilhá-lo. Talvez nem o conhecesse. Este foi o tema do Enem de 1999. Fácil, mas não para grande parte dos candidatos. A maioria perdeu-se no tema.

Veio depois um tema interessante, atual em qualquer tempo: DESENVOLVIMENTO E PRESERVAÇÃO AMBIENTAL: COMO CONCILIAR OS INTERESSES EM CONFLITO? Para o jovem que acompanhasse com alguma atenção o assunto ecologia, não era tão difícil elaborar uma redação aceitável sobre ele. Ainda assim, muitos candidatos não foram capazes de desenvolver o tema com nível razoável de análise.

Em 2002 o tema também foi bem escolhido: O DIREITO DE VOTAR: COMO FAZER DESSA CONQUISTA UM MEIO PARA PROMOVER AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS DE QUE O BRASIL NECESSITA? Fácil discorrer sobre isso, bastando saber raciocinar e, evidentemente, escrever. Milhões não souberam.

No ano seguinte, outro tema de relevância social: A VIOLÊNCIA NA SOCIEDADE BRASILEIRA: COMO MUDAR AS REGRAS DESSE JOGO? Quem sabia escrever bem, bem que escreveu.

Salvo uma ou outra crítica dos críticos mais exigentes e chatos, os temas para a prova de redação foram, na sua grande maioria, bem escolhidos. Veja outro exemplo: COMO GARANTIR A LIBERDADE DE INFORMAÇÃO E EVITAR ABUSOS NOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO? Essa pergunta exigia do candidato ume percepção acurada do problema da liberdade de expressão e dos abusos a ela incorporados por má fé ou inaptidão dos comunicadores da mídia. Mas era um tema atual e pertinente. Ainda não vigorava a expressão fake news.

Há muitos outros exemplos de assuntos bem escolhidos pelo Inep para a redação nos exames do Enem. Mas aí veio o senhor presidente da República e disse que era preciso mudar e formular temas para a redação “com a cara do governo”.

A proposta soava como ditatorial, oriunda da cabeça de um indivíduo insano. Parece que os formuladores do exame não deram bola para a ideia do ignorante mandatário, até porque não tinha nenhum sentido elaborar provas com a cara assustadora do governo. E escolheram, para o Enem 2021, um tema de redação longe do alcance do entendimento bolsonariano: INVISIBILIDADE E DIREITO CIVIL. GARANTIA DE ACESSO À CIDADANIA. Tema tão inteligente não tem mesmo, nem de longe, a cara do governo atual.

VOZ DO PARÁ: Essencial todo dia!

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