O espaço sideral, fungos e casas do futuro

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Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
Depois que esses protótipos são projetados para outros mundos, podemos trazê-los de volta ao nosso próprio planeta

Estudos recentes têm sugerido que os fungos são uma ameaça de contaminação interplanetária negligenciada. Como qualquer pessoa que já teve uma infestação de mofo sabe, os fungos podem ser muito difíceis de matar. Acontece que o mofo também pode ser altamente resistente às duras condições do espaço sideral. Seus esporos podem sobreviver a doses de radiação 200 vezes maiores do que aquelas que matariam um ser humano, relatam pesquisadores da astrobiologia. Estes pesquisadores descobriram que os esporos podem sobreviver a doses de radiação de 500 a 1.000 gray **, dependendo do tipo de radiação a que foram expostos. Os humanos, por outro lado, ficam doentes de radiação em doses de 0,5 gray e são mortos por 5 gray. Também foi descoberto que os esporos sobreviveram a grandes quantidades de radiação ultravioleta de alta energia, que é comumente usada como desinfetante hospitalar. Essa resistência também pode dificultar a eliminação dos riscos para a saúde dos astronautas.

O mofo também pode um dia ameaçar outras partes do sistema solar – com esporos de mofo da Terra sendo transportados involuntariamente. “Os astronautas da Estação Espacial Internacional (ISS) já lutam constantemente contra o mofo, que cresce nas paredes e equipamentos da estação. Esse mofo, é claro, está em uma estrutura protegida na órbita baixa da Terra, onde as doses de radiação são baixas. Fora da estação, as doses são mais altas – e seriam ainda mais altas no casco de uma espaçonave indo para Marte ou além”. E estudos parecem indicar que no vácuo do espaço os esporos de mofo são ainda mais resistentes à radiação.

Os ambientes hostis da Lua e de Marte exigirão novas formas de viver. A ideia é cultivar casas em vez de construí-las, extrair minerais de esgoto em vez de rocha. Recorrendo aos sistemas elegantes de nosso próprio mundo natural, podemos projetar soluções verdes e sustentáveis. Seja em mundos distantes ou em nossa própria Terra em constante mudança, os fungos podem ser o que nos levará audaciosamente para o futuro. É a ciência transformando o temido mofo em uma contribuição muito significativa para viabilizar a exploração de nosso sistema solar e, quem sabe, além dele em um futuro distante. Vale a pena assistir o breve vídeo sobre este tema no Youtube adaptando as configurações para mostrar legendas no idioma de preferência.

“As futuras casas na Lua e em Marte podem ser feitas de fungos? A ficção científica muitas vezes imagina nosso futuro em Marte e em outros planetas como dirigido por máquinas, com cidades metálicas e carros voadores subindo acima de dunas de areia vermelha. Mas a realidade pode ser ainda mais estranha – e “mais verde”. Em vez de habitats feitos de metal e vidro, a NASA está explorando tecnologias que podem desenvolver estruturas a partir de fungos para se tornarem nossos futuros lares nas estrelas e talvez levar a formas mais sustentáveis de viver na Terra também. A ideia é simples: não levar os materiais para Marte, com enormes custos de energia, mas simplesmente cultivá-los, usando cogumelos, ou mais especificamente os fios que compõem a parte principal do fungo que é conhecida como micélio***.

O estudo científico em desenvolvimento busca, na verdade, navegar por um dos mais belos e fascinantes desafios do conhecimento: aprender como podemos usar a própria vida como tecnologia, neste caso os fungos. “Estamos ainda longe de poder cultivar habitats utilizáveis para Marte, mas a pesquisa em estágio inicial está bem encaminhada para provar o potencial dessas soluções criativas”. Ao chegar à lua ou a Marte bastaria “abrir” a estrutura básica e simplesmente adicionar água – que está presente tanto na Lua como em Marte – para que os fungos possam crescer em torno dessa estrutura em um habitat humano totalmente funcional, ao mesmo tempo que todos os cuidados para evitar a contaminação do ambiente extraterrestre estejam sendo tomados. A iniciativa busca projetar não apenas os habitats, mas também os móveis que podem ser cultivados dentro deles. E isso é possível em função do micélio. “Esses minúsculos fios / “fibras” constroem estruturas complexas com extrema precisão, conectando-se a estruturas maiores, como cogumelos. Com as condições certas, eles podem ser persuadidos a fazer novas estruturas – desde um material semelhante ao couro até os blocos de construção de um habitat em Marte.

Créditos: PixabayCréditos: Pixabay

Entre vários caminhos e opções que estão em estudo, um dos conceitos da NASA é o de um habitat com uma cúpula de três camadas. Assim como os astronautas, o micélio fúngico é uma forma de vida que precisa comer e respirar. É aí que, em mais uma combinação da bioengenharia, entra mais uma forma de vida conhecida como cianobactéria – um tipo de bactéria que pode usar a energia do Sol para converter água e dióxido de carbono em oxigênio e alimento para fungos. “A camada mais externa da cúpula habitacional é composta de água congelada e processada a partir dos recursos da Lua ou de Marte. Essa água serve como proteção contra a radiação e escorre para a segunda camada – as cianobactérias. Essa camada pode pegar essa água e fotossintetizar usando a luz externa que brilha através da camada de gelo para produzir oxigênio para os astronautas e nutrientes para a camada final de micélio.

Créditos: https://issuu.com/innovat%20ievematerialen/docs/im20202en/s/10542774Créditos: https://issuu.com/innovat%20ievematerialen/docs/im20202en/s/10542774

E isso é provavelmente apenas o começo. De acordo com a Dra. Lynn Rothschild do projeto “Myco arquitechture”, o fungo micélio poderá ser usado para filtragem de água e sistemas de biomineração que podem extrair minerais de águas residuais, bem como iluminação bioluminescente, regulação de umidade e até habitats autogerados capazes de se curar / se refazer. “E todas essas técnicas também podem ser valiosas para aplicação na Terra. Quando projetamos para o espaço, somos livres para experimentar novas ideias e materiais com muito mais liberdade do que faríamos na Terra. e depois que esses protótipos são projetados para outros mundos, podemos trazê-los de volta ao nosso próprio planeta”. E com cerca de 40% das emissões de carbono na Terra provenientes da construção, aqui há também uma necessidade cada vez maior de habitação sustentável e acessível. E tudo isso é uma combinação “do outro mundo” – e desse também – da engenharia, da ciência da computação, da arquitetura e da biologia.

Mas se o/a leitor/a se surpreendeu com a engenhosidade humana neste caso, assim como com a engenharia (incluindo a bioengenharia) que a materializa, vale a pena, para finalizar, mencionar aqui uma forma criativa de proteger os astronautas da radiação do espaço profundo ao longo dos meses e até anos da viagem de ida e volta entre a Terra, a Lua, Marte e eventualmente outros corpos celestes. Homens e mulheres a bordo das futuras missões à Marte enfrentarão condições precárias, atrofia muscular e tédio potencial. Mas seu maior risco para a saúde vem da exposição à radiação dos raios cósmicos. Uma solução possível e inesperada à primeira vista é forrar as paredes da espaçonave com água, comida e suas próprias fezes. Em um primeiro momento alguns podem até sentir náuseas com esta ideia / solução, mas o fato é que os dejetos humanos sólidos e líquidos seriam colocados em sacos e usados como escudo contra radiação – além de serem desidratados para que qualquer água pudesse ser reciclada para beber. A comida também será armazenada ao redor das paredes da espaçonave porque a comida também é uma boa proteção contra radiação. E ela estaria apenas bloqueando este mal não se tornando em si mesma uma fonte radioativa.

A ciência aplicada é muito bela. Muitas invenções e suas aplicações no dia a dia foram criadas, aprimoradas ou adaptadas no percurso da exploração espacial. Dentre muitas delas e apenas como exemplo, membros artificiais, lentes resistentes a arranhões, bomba de insulina, equipamentos de combate a incêndios, amortecedores para edifícios (segurança contra terremotos), células solares, filtragem de água, melhores pneus, fones de ouvido sem fio, detector de fumaça ajustável, alimentos liofilizados, telefones com câmera, fórmula de nutrição para bebês, etc. Certamente muito mais ainda virá por aí.

**Gray (Gy): O novo sistema internacional (SI) unidade de dose de radiação, expressa como energia absorvida por unidade de massa de tecido. A unidade SI “gray” substituiu a antiga designação “rad”. 1 Gy = 1 Joule/quilograma = 100 rad.

***Micélio é nome que se dá ao conjunto de hifas emaranhadas de um fungo. O micélio vegetativo é a parte correspondente a sustentação e absorção de nutrientes, se desenvolvendo no interior do substrato.

Voz do Pará com Dom Total
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