O milagre do salário mínimo

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Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
O que os economistas neoclássicos sempre disseram sobre o salário mínimo?

Em um evento no Palácio do Planalto, um conhecido economista se referiu à política de valorização do salário mínimo, durante o governo Lula, como sendo um milagre. A plateia deixou passar a ironia, já que ter um economista neoclássico admitindo que todas as suas críticas foram superadas pelos fatos, não tem preço.

Muitos podem ter achado a referência a um milagre como um elogio. Mas, como sabemos, milagre é um evento impossível e que só é explicado por uma intervenção divina. Isso retiraria todo o mérito do governo Lula, pois não teria sido o fundamento teórico dos elaboradores da política pública, a vontade política do presidente, com o apoio histórico do movimento sindical e a resposta produtiva do setor de bens assalariados que explicariam o sucesso da política de valorização do salário mínimo, mas as injunções transcendentais.

O que os economistas neoclássicos sempre disseram sobre o salário mínimo? Primeiro, que esse tipo de regulação no mercado de trabalho cria uma rigidez que impede o equilíbrio entre demanda e oferta de trabalho, pois se o salário mínimo estiver acima do ponto de equilíbrio, haverá desemprego, já que os empregadores não estariam dispostos a demandar nesse nível de salários reais.

Isso não ocorreu no período de Lula e Dilma. Na verdade, o crescimento do salário mínimo foi acompanhado por um forte crescimento da oferta de empregos. Foram criados mais de 18 milhões de ocupações entre 2003 e 2014 (fonte: Ipeadata). Ao mesmo tempo, a taxa de desemprego aberto caiu para 5,0% em dezembro de 2014, saindo de mais de 11,9% em dezembro de 2002. Chegamos a um nível de quase pleno emprego.

Outro argumento neoclássico e novo clássico típico sobre o salário mínimo é que haveria uma pressão sobre o nível de preços que, ao final, não permitiria um aumento do salário mínimo real. Ocorreria apenas uma ilusão monetária de aumento salarial.

Sabemos que houve uma diminuição das taxas de inflação no período em questão e mais que isso, o salário mínimo real cresceu medido pelo INPC e também pela cesta básica de alimentos.

Outro argumento comum é que o equilíbrio de fato no mercado de trabalho se daria abaixo do nível do salário mínimo, com geração de empregos informais e de autônomos. Mas houve crescimento da proporção de trabalhadores formais de 72% de janeiro de 2002 a maio de 2016,  um ritmo extraordinário (fonte: Bacen).

E, por último, mas não menos importante, que o aumento do salário mínimo aumentaria o déficit da previdência e arruinaria as finanças de estados e municípios. Não foi o que ocorreu. Como previsto pela teoria da demanda efetiva, o crescimento da renda no período aumentou a arrecadação tributária, o que permitiu uma queda do endividamento público em relação ao PIB em todas as esferas da federação.

Nenhuma das predições feitas com base nas teorias neoclássicas e novo clássicas se realizaram. Ora, a qualidade de uma análise econômica repousa na teoria, na estatística e na história, como nos ensina Schumpeter (História da Análise Econômica). As teorias usadas pelos analistas do milagre do salário mínimo falharam na capacidade de predição, as estatísticas mostram o contrário do que seria esperado pela teoria e a história registrou um grande avanço na qualidade do mercado de trabalho brasileiro.

Por sua vez, o crescimento real de 77% (fonte: Dieese) no salário mínimo, acompanhado pelo aumento do nível de empregos e formalização, explica o fechamento do leque salarial e, portanto, das desigualdades intersalariais. Caíram as amplitudes salariais e o Indice de Gini. ( ver Prado:2006)

Como a aposentadoria mínima, as pensões e o benefício assistencial tinham que seguir o piso estabelecido pelo salário mínimo, houve um significativo aumento real para os segmentos protegidos pela previdência e assistência.

Todos esses efeitos acumulados e mais o Programa Bolsa Família reduziram a pobreza e a fome no país, a ponto de a ONU ter tirado o Brasil do Mapa da Fome no mundo.

Desde a sabotagem ao governo Dilma, o golpe do impeachment da presidente em 2016, o breve período de governo do infame vice-presidente Temer e a eleição de Bolsonaro, que faz um governo desastroso, todos os indicadores sociais positivos, construídos durante os oito anos de Lula e quatro de Dilma (seus primeiros dois do segundo mandato foram de paralisia, provocada pela sabotagem comandada por Eduardo Cunha-pautas bombas e Temer), regrediram.

O inacreditável teto de gastos criado pela Emenda Constitucional 95  no governo Temer, que significou um abandono de fato dos compromissos com a Agenda 2030 da ONU e com o avanço necessário das políticas sociais, a reforma da previdência de Bolsonaro/Rodrigo Maia, a reforma trabalhista, o abandono da política de valorização do salário mínimo – já iniciada com Temer, o desmonte das políticas sociais e ambientais, o colapso econômico provocado pela gestão do governo atual e aprofundado por uma condução criminosa da crise sanitária nos  jogaram no caminho de uma crise social de grandes proporções. Desemprego, queda nos rendimentos, recessão, pobreza e fome crescente e quase 400 mil mortos pela COVID-19 . É preciso reconstruir o país e o primeiro passo é derrotar o reacionarismo desastroso que vem provocando esse caos.

VOZ DO PARÁ: Essencial todo dia!

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