Quais os impactos da falta da segunda dose da Coronavac

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Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
Estados tiveram que suspender aplicação de reforço por falta de vacinas. Ministro Ricardo Lewandowski diz que gestores poderão responder por improbidade se não garantirem imunidade completa

A aplicação da segunda dose da Coronavac, necessária para garantir uma maior e mais duradoura imunidade contra a covid-19 na população, está sendo suspensa em cidades de pelo menos 18 estados brasileiros por falta de vacinas. O problema já atingiu ao menos nove capitais brasileiras e afetou cerca de 175 mil pessoas até segunda-feira (3), segundo um levantamento publicado pelo jornal O Estado de S. Paulo.

A suspensão da segunda dose acontece devido a um erro de planejamento: os municípios decidiram, por recomendação do Ministério da Saúde, aplicar todas as vacinas enviadas pelo Programa Nacional de Imunizações para acelerar a campanha de combate à covid-19 e não reservaram uma quantidade suficiente para as doses de reforço. Para ter melhor eficácia, a segunda dose da Coronavac deve ser aplicada num intervalo de 21 a 28 dias após a primeira.

Desde o início da vacinação contra a covid-19 em janeiro, o Brasil sofre com escassez de doses. Até terça-feira (4), apenas 15,26% da população recebeu ao menos uma dose, e somente 7,69% recebeu as duas, segundo dados do consórcio de veículos da imprensa.

76% das doses distribuídas aos estados e municípios até terça-feira (4) são da Coronavac, segundo o Ministério da Saúde

O vaivém do Ministério da Saúde

A orientação do governo federal sobre o uso das doses distribuídas mudou ao menos quatro vezes desde fevereiro. No dia 19 daquele mês, o então ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, disse aos prefeitos não ser necessário reservar a segunda dose. Cerca de duas semanas depois, o ministério recomendou que elas fossem separadas. Em março, porém, pouco antes de deixar o cargo, Pazuello voltou a recomendar o uso de todos os imunizantes.

Três dias depois de assumir a pasta, o substituto de Pazuello, Marcelo Queiroga, alterou novamente a orientação e pediu, em 26 de março, que as prefeituras fizessem um estoque de vacinas para a segunda dose. Muitas cidades se basearam no ex-ministro e acabaram ficando sem imunizantes devido aos atrasos para o envio de novas remessas.

A decisão do Supremo

Os gestores públicos que atrasarem a aplicação da segunda dose poderão responder ações de improbidade, segundo o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, em decisão liminar na segunda-feira (3) que proibiu que o Rio de Janeiro mude a ordem de vacinação de grupos prioritários. O estado tentou antecipar a vacinação de professores da rede pública e de profissionais das forças de segurança, para que ocorresse simultaneamente à de idosos.

A ordem dos grupos prioritários é definida pelos estados e municípios de acordo com suas realidades locais. Para o ministro, mudanças podem ocorrer apenas se não prejudicarem o prazo “estabelecido pelos fabricantes das vacinas — e aprovado pela Anvisa — para a aplicação da segunda dose do imunizante naquelas pessoas que já receberam a primeira”.

Pelo entendimento do ministro, a vacinação de professores e policiais não poderia ocorrer, portanto, se os grupos de idosos e pessoas com comorbidades ainda esperam a complementação da imunização e correm o risco de ficar sem a segunda dose. O desperdício de “recursos materiais e humanos já investidos na campanha de vacinação inicial” poderia ocorrer sem a imunização total da população e isso caracterizaria “improbidade administrativa dos gestores da saúde pública local”, de acordo com Lewandowski.

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, na terça-feira (4), o secretário executivo do Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais), Mauro Junqueira, disse que a decisão do ministro “assusta” e inviabiliza o trabalho dos secretários de Saúde.

“Já temos uma rotatividade na gestão muito grande. Ela acontece por esse tipo de coisa. O gestor ganha mal e tem uma responsabilidade tremenda. Vem um órgão de controle e fala em improbidade, aí, [o gestor] vai embora. O problema é a falta de vacina. Deveriam cobrar isso”, afirmou ao jornal.

O atraso nas doses

A aplicação de todas as doses distribuídas poderia ocorrer caso o governo federal tivesse à disposição uma grande quantidade de vacinas para distribuir aos estados e municípios. Mas não é isso o que tem acontecido.

O fornecimento da Coronavac pelo Instituto Butantan, ligado ao governo do estado de São Paulo, vem atrasando porque o Brasil é dependente da importação do IFA (Ingrediente Farmacêutico Ativo), o princípio ativo da vacina que é envasada no país. O insumo é enviado da China.

Devido à corrida global pelos imunizantes, as remessas de IFA já atrasaram tanto para o Butantan quanto para a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), que envasa a vacina de Oxford/AstraZeneca. Por causa dos atrasos, o Butantan, por exemplo, ainda não conseguiu cumprir o cronograma para a entrega de 46 milhões de doses para o governo federal. Não há prazo para regularizar a situação.

O que acontece sem a segunda dose

A segunda dose é um reforço da primeira e serve para estimular o corpo a produzir uma quantidade ainda maior de anticorpos. Em entrevista ao jornal O Estado de Minas, na segunda-feira (3), o infectologista Dirceu Greco, que é professor emérito da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), descreveu a segunda dose como um “empurrão”.

Segundo ele, a imunidade começa após quatro ou cinco dias depois da pessoa tomar a primeira dose. “A partir daí, ela vai crescendo, mas chega a um percentual que não é satisfatório. Quando a segunda dose é aplicada, chega naquela eficácia que foi comprovada, com mortalidade e doença grave muito baixas. A segunda dose estimula mais rapidamente e intensamente a produção de anticorpos”, disse.

Para o professor, o problema de não tomar a segunda dose é que a eficácia da vacina começa a se perder com o tempo. Com uma dose só, a imunidade é parcialmente adquirida.

Um estudo feito no Chile, que também usa a Coronavac, mostrou que a vacina teve uma eficácia de apenas 16% contras as formas sintomáticas da covid-19 após a primeira dose aplicada em cerca de 10,5 milhões de pessoas. A proteção com a segunda dose saltou para 67%.

Ainda não há estudos sobre o índice de eficácia da Coronavac caso as doses sejam mais espaçadas além dos 28 dias recomendados. Em março, o Ministério da Saúde disse que a segunda dose deve ser tomada mesmo por quem perdeu o prazo correto.

“A população deve tomar a segunda dose da vacina covid-19 mesmo que a aplicação ocorra fora do prazo recomendado pelo laboratório. Essa é a orientação do Ministério da Saúde, que reforça a importância de se completar o esquema vacinal para assegurar a proteção adequada contra a doença”

Ministério da Saúde em nota divulgada em março

Segundo a pasta, é provável que a eficácia da vacina não seja comprometida com um pequeno atraso na aplicação da segunda  dose. Mesmo quem tomar as duas doses deve seguir com os cuidados, como manter o distanciamento social e usar máscaras, porque nenhuma vacina garante 100% de proteção, e a população só ficará segura com uma ampla cobertura.

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