Uma boa leitura é excelente para nos fazer desligar do quotidiano e nos projetar para os mais variados lugares, vivendo histórias que nos deixam indignados, emocionados, revoltados…
A gente divide a dor e a alegria, as derrotas e as conquistas com os personagens, que de tão intensas que se tornam essas emoções, fazem parte da nossa vida por alguns dias e quando a leitura termina, fica uma saudade imensa.
Foi assim com o livro “Torto Arado”, do Itamar Vieira Júnior, vencedor de diversos prêmios e que já nas primeiras páginas consegue nos arremessar para a vida de duas meninas, negras, num lugar que dá uma vontade imensa de conhecer.
As tradições africanas, o conhecimento daquele povo e a sua simplicidade me fizeram devorar o livro. Chorava, comemorava, refletia e ao terminar a leitura fiquei ali, sentado, digerindo tudo que vivi naquelas páginas, junto a Bibiana, Belonísia e tantas outras figuras importantes na construção da história, do livro e nossa.
Assim também aconteceu com o livro “Maha Mamo”, escrito pela Maha em parceria com o genial Darcio Oliveira. A história de um pai cristão e uma mãe muçulmana que se unem afetivamente, mas que não podem ter essa relação reconhecida, admitida, pois na Síria, onde vivem, é impossível a união de religiões diferentes.
Os frutos dessa relação, seus filhos, não existem no papel, o que os tornou apátridas, não sendo reconhecidos na Síria e nem em seu local de nascimento, o Líbano, onde a lei diz que a nacionalidade vem do sangue e não do território.
A luta desses três filhos para conseguir uma nacionalidade nos envolve do início ao fim. Eu disse à autora que parecia que eu havia entrado numa montanha russa, em que num momento tudo parece estar muito bem para, em seguida, despencar de uma só vez e vice-versa.
A história da Maha Mamo eu conheci de perto, mas não sabia dessa profundidade e intensidade relatadas no livro. Ela hoje viaja o mundo lutando por uma causa que é de milhões de pessoas, mas que a tornou porta-voz dessa luta por ter vivido na pele essa necessidade que todos têm de pertencimento a uma nação.
No “Além da Lama”, do Leonard Farah, capitão do Corpo de Bombeiros Militares de Minas Gerais, que atuou no rompimento das barragens em Itabirito, Mariana e Brumadinho, a emoção foi também muito intensa.
O capitão Leo Farah tem treinamentos diversos em situações de emergência, com uma experiência vasta e um conhecimento amplo, o que é imprescindível para a sua atuação, ainda mais à frente de diversos outros profissionais. Mas a humanidade do Farah sobressai, colocando-o ainda mais forte nas missões que abraça.
O livro trata especificamente das primeiras horas de trabalho da equipe dos bombeiros, e outros profissionais, em Bento Rodrigues, distrito de Mariana, MG. A forma como o autor relata as intervenções dos bombeiros e a interação com a comunidade nos envolve de tal maneira que é preciso, em certo momento, “parar para tomar um fôlego” antes de continuar.
A história é dinâmica e nos conduz para aquelas 15 horas iniciais de atuação dos profissionais, relatando sentimentos múltiplos de todos os envolvidos, inclusive dos moradores, demonstrando seu medo, angústia, dor, tristeza, união, gentileza, além de enorme empatia e gratidão também.
Uma amiga disse, certa vez, que a leitura favorece a elasticidade do cérebro, permitindo vivenciar mundos diferentes e estimulando a nossa criatividade para lidar com situações reais. Quando a gente volta para o mundo real, talvez estejamos mais fortes para viver com mais consciência e intensidade à nossa vida.
Cada pessoa é um universo que nós não viveremos e que, ao conhecer a sua história, somos presenteados com conhecimentos que promovem muita reflexão e crescimento. Até aqueles livros não lidos, que nos rodeiam, dizem muito sobre nós mesmos, sobre a nossa identidade.