Câmara afrouxa Lei de Improbidade Administrativa e facilita a vida de políticos corruptos

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Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
Proposta restringe punições a agentes públicos em casos de corrupção e abre brecha para impunidade; placar foi de 408 votos a 67

Em acordo que uniu aliados do presidente Jair Bolsonaro e deputados de oposição ao governo, a Câmara aprovou nessa quarta-feira, 16, por ampla maioria, projeto que afrouxa a Lei de Improbidade Administrativa. Com um placar de 408 votos a favor e 67 contra, a votação representa mais um passo na tentativa de blindar políticos de investigações, iniciada após a Lava Jato. Considerada por integrantes do Ministério Público e de associações como uma brecha para a impunidade, a proposta segue agora para o Senado.

Sob a justificativa de proteger bons gestores, a proposta que recebeu sinal verde da Câmara abre caminho para impedir a punição de agentes públicos que cometem irregularidades. Com apoio do Palácio do Planalto, o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), teve papel importante para levar à votação mudanças na lei que classificou como “antiquada” e “ultrapassada”.

Uma alteração de última hora impediu que a contratação de parentes, prática conhecida como nepotismo, fosse totalmente liberada mediante a apresentação de um bom currículo, mas ainda há insegurança jurídica sobre a possibilidade de punir nomeações por indicação política.

Pela redação do relator do projeto, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), era permitido dar emprego a parentes caso os indicados ostentassem “adequada capacitação”. A previsão descumpria a Súmula 13 do Supremo Tribunal Federal (STF), que proíbe contratações de familiares, independentemente da qualificação técnica.

Após emenda proposta pelo líder do PSB, Danilo Cabral (PSB-PE), o texto do projeto foi adequado à regra definida pelo Supremo. Mesmo assim, porém, foi mantido um parágrafo segundo o qual “não se configurará improbidade a mera nomeação ou indicação política por parte dos detentores de mandatos eletivos, sendo necessária a aferição de dolo com finalidade ilícita por parte do agente”.

‘Avanço’

Ao abrir a votação, Lira fez um longo discurso em defesa do projeto, sob o argumento de que o texto é um avanço constitucional e reforça a segurança jurídica. Condenado em ações de improbidade na Justiça alagoana e alvo de outras ações na Justiça Federal no Paraná, Lira comanda o Centrão e é um dos possíveis beneficiados com a aprovação do projeto. Uma das ações contra ele, aberta com base nas apurações da Operação Taturana – que constatou um esquema de “rachadinha” na Assembleia de Alagoas à época em que o presidente da Câmara era deputado estadual –, tramita no Superior Tribunal de Justiça. Além de Lira, outros parlamentares devem ser favorecidos por mudanças na lei. Dos 24 integrantes da comissão especial que analisou a proposta na Câmara, sete respondem a ações de improbidade.

Uma das possibilidades de benefício a parlamentares é justamente o fim da perda da função pública a condenados que tenham mudado de cargo ao longo do processo. Atualmente, se um senador é condenado à perda do cargo por atos que praticou no passado, quando era prefeito, por exemplo, ele perde a atual função. Com o novo projeto, essa punição não ocorre.

Críticas

Os partidos Novo, Podemos e PSOL votaram contra o texto, acompanhados por alguns deputados do PDT e do PSB, incluindo o líder da Oposição, Alessandro Molon (PSB-RJ). “Esse projeto corta, dilacera, mutila o espírito da proposta, então eu queria pedir a todos, a gente precisa dar um passo para trás para discutir decentemente e votar com consciência”, afirmou a deputada Adriana Ventura (Novo-SP).

“Impressiona a aliança que foi feita entre o petismo e o bolsonarismo nesse retrocesso, tanto no combate à corrupção como à negligência na administração pública. O texto já começa excluindo todas as hipóteses de culpa grave”, disse o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP).

O Podemos, partido do autor do projeto original, Roberto Lucena (SP), apresentou um requerimento para que o texto original fosse aprovado, mas o pedido foi rejeitado.

O projeto também limita ao período de 180 dias, prorrogável por apenas uma vez, o prazo para conclusão de inquéritos civis, etapa preliminar à apresentação de ações de improbidade. Foi suprimida, ainda, a etapa da defesa prévia nas ações de improbidade, prevista na lei vigente. “É considerada ineficaz para as partes”, justificou Zarattini.

Irritado com postagens do procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Sarrubbo, que batizou o projeto como “Lei da Impunidade”, Lira disse que o chefe do Ministério Público pediu a ele que não pautasse proposta que acaba com os supersalários no Judiciário. Sarrubbo afirmou depois, em nota, que teve com Lira um diálogo “absolutamente republicano”.

“A audiência a que se refere o eminente presidente da Câmara, deputado Arthur Lira, deu-se exatamente neste contexto. O diálogo institucional acerca das matérias que afetam o Ministério Público configura algo absolutamente republicano”, afirma trecho da nota no Ministério Público de São Paulo. “É exatamente esse diálogo que o MPSP preconiza, neste momento, no que tange ao Projeto de Lei 10887/2018, cujos termos podem transformar a Lei da Improbidade na Lei da Impunidade, algo que contraria frontalmente os interesses da sociedade, destinatária última da atuação da nossa instituição”.

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