Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul apresentam níveis de desenvolvimento humano e qualidade de vida que contrastam com sua força econômica
Apesar do impressionante crescimento econômico impulsionado pelo agronegócio, as capitais da região Centro-Oeste do Brasil, como Campo Grande, Cuiabá e Goiânia, enfrentam sérios problemas sociais. A produção de grãos na safra 2022/2023 atingiu um recorde de cerca de 323 milhões de toneladas, representando um aumento de 18% em comparação à safra anterior. Isso resultou em um crescimento de 15,1% no Produto Interno Bruto (PIB) da agropecuária, superando setores como a indústria e serviços. No entanto, essa pujança econômica não se traduziu em melhorias significativas nos indicadores sociais dessas cidades.
Desigualdade social em meio à prosperidade econômica
Embora estejam localizadas em uma das regiões mais produtivas do país, as capitais dos estados de Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul apresentam níveis de desenvolvimento humano e qualidade de vida que contrastam com sua força econômica. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que Campo Grande, Cuiabá e Goiânia possuem PIB per capita abaixo da média nacional, e nenhum desses municípios alcançou a universalização do esgotamento sanitário.
Além disso, essas capitais estão longe de ocupar as primeiras posições em indicadores de escolarização e apresentam taxas de mortalidade infantil alarmantes. Por exemplo, Campo Grande possui apenas 16,6% dos seus domicílios com acesso a esgoto tratado, enquanto Cuiabá e Goiânia têm um quarto de suas residências sem esse serviço básico.
Discrepâncias e vulnerabilidades
Os indicadores sociais dessas capitais expõem uma lacuna significativa entre o crescimento econômico e o bem-estar de suas populações. Em Campo Grande, a taxa de mortalidade infantil é de 11,9 por mil nascidos vivos, enquanto Cuiabá apresenta uma taxa ainda mais alta, com 13,63 por mil. Essas cidades também enfrentam grandes disparidades em termos de escolarização e distribuição de renda, com baixos salários médios e níveis insuficientes de educação básica.
De acordo com Jorge Abrahão, coordenador-geral do Programa Cidades Sustentáveis, essas disparidades refletem um modelo de desenvolvimento que, apesar do sucesso econômico em termos de agronegócio, não consegue garantir a melhoria das condições de vida da população. Abrahão ressalta que, apesar de terem condições econômicas favoráveis, essas cidades enfrentam grandes desafios na implementação de políticas públicas eficazes que atendam às necessidades sociais.
Desigualdades raciais e de gênero
Outro aspecto preocupante é a persistência das desigualdades raciais e de gênero. Em todas as três capitais, jovens negros e indígenas têm taxas de homicídio significativamente maiores em comparação a jovens brancos. Em Cuiabá, por exemplo, a taxa de homicídios entre negros e indígenas é dez vezes maior do que a de brancos. Além disso, as mulheres ainda ganham consideravelmente menos que os homens, com a diferença salarial atingindo 28% em Goiânia, 22,9% em Cuiabá e 18,95% em Campo Grande.
Participação social e desafios ambientais
Embora as três capitais tenham implementado a maioria dos conselhos de participação e promoção de direitos humanos previstos em lei, como conselhos tutelares e de promoção da igualdade racial, sua capacidade de gestão de riscos climáticos permanece baixa. Nenhuma das três cidades atingiu metade das estratégias recomendadas para gerenciar riscos relacionados a eventos climáticos, como enchentes e deslizamentos. Com o bioma Cerrado cada vez mais ameaçado pelo desmatamento, a emissão de dióxido de carbono (CO2) se tornou um problema grave. Cuiabá e Campo Grande estão entre as quatro cidades com as maiores emissões líquidas de CO2 no Brasil, agravadas pelas queimadas recorrentes na região.
Algumas considerações
O cenário nas capitais do Centro-Oeste é uma clara demonstração de que o crescimento econômico por si só não é suficiente para resolver os problemas sociais complexos que essas cidades enfrentam. Apesar da prosperidade agrícola, os desafios relacionados à desigualdade, educação, saúde e infraestrutura básica permanecem graves. A sociedade civil, gestores públicos e o setor privado precisam atuar em conjunto para reverter esse quadro e garantir que o desenvolvimento econômico seja acompanhado por melhorias nas condições de vida da população.
Ao mesmo tempo em que celebramos os avanços da agropecuária no Brasil, é fundamental reconhecer que o progresso social não pode ser deixado de lado. A riqueza gerada pelo agronegócio deve ser redistribuída de forma mais equitativa, promovendo um desenvolvimento que seja verdadeiramente sustentável e inclusivo.