Carros elétricos, baterias e o aquecimento global

Leia mais

Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
Recarregando baterias em 3 minutos? O setor de transportes é responsável por vinte e um por cento da emissão global de CO2. Foto (Illus_man via Shutterstock)

Segundo a Agência Internacional de Energia (International Energy Agency – IEA) o setor de transportes é responsável por vinte e um por cento da emissão global de CO2. As viagens rodoviárias são responsáveis por três quartos das emissões dos transportes. A maior parte vem de veículos de passeio – carros e ônibus – e caminhões que transportam cargas. Assim sendo, uma vez que todo o setor de transportes é responsável por 21% das emissões totais e o transporte rodoviário é responsável por três quartos das emissões de transporte, o transporte rodoviário é responsável por 15% do total de emissões de CO2 no planeta.

A aviação que costuma receber muita atenção nas discussões sobre ações contra as mudanças climáticas responde por 11,6% das emissões dos transportes. As viagens ferroviárias de passageiros e de carga respondem por 1% das emissões. A participação das emissões de transporte marítimo nas emissões antropogênicas globais tem aumentado de forma sistemática e está hoje acima de 3%.

Um veículo de passageiros típico emite cerca de 4,6 toneladas métricas de dióxido de carbono por ano. Esse número pode variar com base no combustível de um veículo, na economia de combustível e no número de quilômetros percorridos por ano. Além do dióxido de carbono (CO2), os automóveis produzem metano (CH4) e óxido nitroso (N2O) a partir do tubo de escape (escapamento). As emissões desses gases são pequenas em comparação com o CO2; no entanto, o impacto dessas emissões pode ser importante porque elas têm um maior potencial de aquecimento global (PAG) do que o CO2. E embora a economia de combustível ao não usar uma mistura de etanol em seu veículo seja ligeiramente maior do que ao usar gasolina com etanol, as emissões de CO2 pelo tubo de escape por quilometro serão semelhantes. Isso ocorre porque a gasolina tem mais carbono por litro do que o etanol.

Em todo o mundo, muitos dos obstáculos (técnicos e financeiros) à adoção de carros elétricos têm sido removidos nos últimos anos. No entanto, ainda não foi alcançado um aumento significativo no número de veículos elétricos nas ruas e nas estradas. Existem ainda razões técnicas, econômicas e também, segundo estudos da Universidade de Genebra, cognitivas para que isso aconteça. Neste último caso, por exemplo, os cientistas descobriram que um viés cognitivo persistente ainda está em nosso caminho. Ou seja, os consumidores acreditam que a atual gama de carros elétricos não é suficiente para cobrir suas viagens diárias. Eles estão subestimando as capacidades /alcance destes veículos enquanto (substancialmente) superestimam a distância das viagens do dia-a-dia.

Os cientistas de Genebra descobriram que mais de 90% das viagens de carro podem ser feitas com um veículo com autonomia de cerca de 200 quilômetros. É um alcance bem modesto, visto que alguns modelos atuais alcançam uma autonomia de mais de 400 quilômetros antes de exigir uma recarga. Segundo os pesquisadores, um alcance melhor, por exemplo além de 300 km, não melhora o ajuste às necessidades diárias. Teria apenas um efeito marginal no número de viagens alcançáveis com uma única carga. Mas para países com dimensões continentais como o Brasil, onde só um estado como Minas Gerais tem um território mais de quatorze vezes maior que o da Suíça e onde a infraestrutura de transporte é comparativamente muito inferior, o raciocínio dos cientistas suíços nos traz muito pouco consolo.

De toda forma, a adaptação tem ocorrido de forma lenta. Embora os carros elétricos estejam, em média, mais baratos do que há cinco anos, os preços ainda estão longe de serem competitivos, principalmente para a realidade dos países em desenvolvimento. A infraestrutura de carregamento que é uma das principais condições necessárias para melhorar o avanço do transporte elétrico também está longe de poder ser comparada com a estrutura de abastecimento dos veículos atuais movidos por motores tradicionais à combustão interna. Só uma viagem em um fim de semana prolongado para visitar parentes em uma cidade relativamente próxima para os padrões brasileiros já seria atualmente inviável para um carro elétrico.

O desenvolvimento das baterias continua a ser o maior desafio técnico e financeiro. Lítio-íon e fosfato de lítio-ferro (ou LFP) dominam o cenário atual das baterias para veículos elétricos. Elas têm prós e contras em termos de alcance, preços de matérias-primas e fatores tecnológicos. A Tesla usa baterias de íon de lítio e LFP. A arquirrival emergente BYD (chinesa) usa uma bateria LFP especializada. Mas as empresas de baterias e as montadoras estão investindo pesado para construir baterias mais baratas, mais densas e mais leves, buscando ainda explorar alternativas aos químicos dominantes à base de lítio.

As inovações potencialmente de maior impacto no desenvolvimento de novas baterias podem vir das pesquisas com baterias de íons de sódio e com as chamadas baterias de estado sólido. Em julho de 2021, a CATL (Contemporary Amperex Technology Co Ltd – principal fabricante de baterias para veículos elétricos na China) revelou a primeira geração de suas baterias de íons de sódio para uso em veículos elétricos e armazenamento estacionário, visando um lançamento já para o ano de 2023. Além de íons de sódio, a tecnologia de baterias de estado sólido poderá também contribuir para a substituição das células de íons de lítio. As baterias de estado sólido prometem densidade de energia muito maior e carregamento mais rápido, além de menor risco de incêndio. A grande diferença de uma bateria de estado sólido está dentro do eletrólito. Enquanto as baterias de íons de lítio usam um eletrólito líquido, suas primas de estado sólido usam uma forma sólida.

Engenheiros também descobriram recentemente uma maneira para mais que dobrar a vida útil das baterias usadas em smartphones e carros elétricos. O avanço da bateria foi demonstrado com sucesso por pesquisadores da Universidade de Queensland, na Austrália. Eles foram capazes de aumentar a vida útil de uma bateria de íons de lítio (li-ion) de centenas para milhares de ciclos de carga /descarga. Em um processo com potencial para escalabilidade industrial, essa nova abordagem adiciona um fino revestimento de materiais protetores para as futuras gerações de baterias de alta energia. O método funciona adicionando uma camada fina de átomos de cristais cultivados em laboratório à superfície do cátodo de alta tensão da bateria para reduzir significativamente a corrosão que ocorre durante os ciclos de carregamento. Esta técnica também significa que os metais preciosos utilizados atualmente para evitar a corrosão que ocorre nos cátodos das atuais baterias serão menos necessários.

Todos estes novos desenvolvimentos tecnológicos descritos acima têm o potencial para mudar as regras do jogo. Os carros elétricos oferecem muitos benefícios, desde custos operacionais mais baixos até uma aceleração mais rápida e suave. No entanto, os carros elétricos ainda sofrem também com uma desvantagem adicional, a saber, o tempo requerido para o recarregamento de suas baterias. Ainda estamos à mercê de carregadores tradicionais e dos carregadores tradicionais “rápidos” quando se trata de viagens longas. Os tempos de carregamento normalmente variam entre 10 horas (em um carregador lento) a cerca de 20 minutos nos carregadores rápidos mais rápidos. Os cientistas agora estão procurando uma tecnologia que poderia carregar um carro elétrico em poucos minutos: “em um esforço para resolver os problemas com os tempos de carga, os cientistas analisaram o reino esotérico da física quântica. A noção de uma “bateria quântica” foi inicialmente introduzida por Alicki e Fannes em um grande estudo lançado em 2012. Propriedades quânticos, como o entrelaçamento quântico, foram propostos como uma maneira de acelerar drasticamente o processo de carregamento da bateria, carregando todas as células da bateria ao mesmo tempo coletivamente. Carregar todas as células de uma só vez parece promissor, pois as baterias modernas geralmente contêm um grande número de células, tornando-as particularmente adequadas para esse conceito”.

Mais recentemente, um grupo de pesquisadores do Centro de Física Teórica de Sistemas Complexos da Coréia do Sul se propôs a examinar esse assunto com mais detalhes. O artigo científico resultante indica o ganho de velocidade de carregamento que pode ser alcançado. Enquanto a velocidade máxima de carregamento aumenta linearmente com o número de células em baterias convencionais, o estudo mostrou que as baterias quânticas podem alcançar escala quadrática na velocidade de carregamento. Em suma, o carregamento quântico pode levar a uma aceleração de 200 vezes em relação às baterias convencionais, o que significa que os tempos de carregamento doméstico seriam reduzidos de cerca de 10 horas para aproximadamente 3 minutos. Ficaríamos assim muito mais próximos do tempo de abastecimento em um posto de combustíveis como os que temos hoje.

Embora ainda tenhamos de enfrentar obstáculos técnicos, os progressos feitos com as tecnologias emergentes são promissores. Em particular é importante observar que a tecnologia quântica ainda está em sua infância, o que significa que há um longo caminho a percorrer antes que possamos colher os benefícios. No entanto, esses resultados nos desenvolvimentos de novas tecnologias de baterias são animadores e podem revolucionar o futuro da energia nos colocando em mais um caminho para um futuro renovável. Até porque, como vimos anteriormente, 15% do total de emissões de CO2 no planeta não é pouca coisa e o combate efetivo ao aquecimento global só virá de um conjunto grande de ações integradas. (por José Antonio de Sousa Neto)

VOZ DO PARÁ: Essencial todo dia!

- Publicidade -spot_img

More articles

- Publicidade -spot_img

Últimas notíciais