Segundo o estudo, o etanol a partir do milho seria mais intensivo em carbono do que a gasolina
O etanol “não é um amigo do clima”, diz um novo estudo científico publicado no journal PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences, “Anais da Academia Nacional de Ciências”). O biocombustível provavelmente contribui muito mais para o aquecimento global do que a gasolina pura.
Ao menos na forma como é produzido nos EUA, através de milho. Desde 2005, o etanol é misturado à gasolina nos EUA, em proporção de até 10%. Aqui no Brasil, em que a política começou nos anos 1970, a gasolina tem 27% de etanol.
A pesquisa traz que a produção de etanol nos Estados Unidos não cumpriu as metas de emissões de gases de efeito estufa da própria política no país. Houve impactos negativos na qualidade da água, na área de terra usada para conservação e outros processos do ecossistema.
O governo do presidente Joe Biden está revisando as políticas sobre biocombustíveis como parte de um esforço mais amplo para descarbonizar a economia dos EUA até 2050. Como foco, está o combate às mudanças climáticas.
A pesquisa foi financiada em parte pela Federação Nacional da Vida Selvagem e pelo Departamento de Energia dos EUA e contradiz pesquisas anteriores encomendadas pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), que mostram o etanol e outros biocombustíveis como relativamente verdes.
Em outras palavras, segundo traz o estudo, o etanol a partir do milho seria mais intensivo em carbono do que a gasolina. Na pesquisa, são levadas em consideração as emissões resultantes de mudanças no uso da terra para o cultivo de milho, juntamente com o processamento e combustão.
Em termos simples: tratores, usinas, indústrias químicas, caminhões, usinas elétricas, a mudança de florestas para plantações etc.: tudo isso, usado na produção de etanol, pode gerar e gera emissões. E, somando tudo, a conta não fecha.
Intensidade de carbono 24% maior
Conforme traz o estudo, as mudanças “aumentaram o uso anual de fertilizantes em todo o país em 3 a 8%, aumentaram os degradantes da qualidade da água em 3 a 5% e causaram emissões suficientes de mudanças no uso da terra doméstica, de modo que a intensidade de carbono do etanol de milho produzido sob o RFS [Padrão de Combustível Renovável nos EUA] não seja menor que a gasolina, mas pelo menos 24% maior”.
Dr. Tyler Lark, cientista assistente do Centro de Sustentabilidade e Meio Ambiente Global da Universidade de Wisconsin-Madison e principal autor do estudo, diz que “o etanol de milho não é um combustível amigo do clima”. Já Geoff Cooper, presidente e CEO da Renewable Fuels Association (RFA) – o lobby do comércio de etanol – chamou o estudo de “completamente fictício e errôneo”, argumentando que os autores usaram “suposições de pior caso [e] dados escolhidos a dedo”.
Conforme traz um post do site Energy, o RFA refuta o estudo negativo de uso da terra com etanol. Cooper diz que o trabalho de Lark “não deve ser levado a sério”. O CEO diz que “os autores parecem mais interessados em caluniar agricultores e obter manchetes lascivas do que examinar os fatos”.
Expansão do cultivo de milho para uso em combustível
De acordo com o Padrão de Combustível Renovável (RFS) dos EUA, uma lei promulgada em 2005, as refinarias de petróleo do país são obrigadas a misturar cerca de 15 bilhões de galões de etanol à base de milho na gasolina anualmente. A política pretendia reduzir as emissões, apoiar os agricultores e reduzir a dependência dos EUA das importações de energia.
Desde então, o cultivo de milho cresceu 8,7% e se expandiu para 6,9 milhões de acres adicionais de terra entre 2008 e 2016, segundo o estudo. Isso levou a mudanças generalizadas no uso da terra, incluindo o cultivo de áreas agrícolas que de outra forma teriam sido aposentadas ou inscritas em programas de conservação.
Além disso, houve o plantio de terras agrícolas existentes com mais milho. A lavoura dos campos libera carbono armazenado no solo, enquanto outras atividades agrícolas, como a aplicação de fertilizantes nitrogenados, também produzem emissões.
Contradições
Por outro lado, um estudo de 2019 do USDA trouxe que a intensidade de carbono do etanol era 39% menor que a gasolina, em parte devido ao sequestro de carbono associado ao plantio de novas terras agrícolas. Tais informações têm sido amplamente citadas pela indústria de biocombustíveis.
Entretanto, Lark diz que essa pesquisa subestimou o impacto das emissões da conversão de terras. O USDA não respondeu a um pedido de comentário da Reuters, fonte desta nota.
A Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA), que administra a política de biocombustíveis do país, está considerando mudanças no programa. Sob o RFS, o Congresso norte-americano estabeleceu requisitos de combinação até 2022. Mas não além, dando à EPA autoridade para impor reformas. A agência, por sua vez, planeja propor os requisitos de 2023 em maio.