Faria Lima está promovendo o desmatamento na Amazônia e levanta debate: como evitar que o mercado financeiro financie a destruição ambiental?

Títulos ligados a desmatadores na Amazônia expõem lacunas no mercado financeiro brasileiro

REPÓRTER BRASIL – A venda de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) por R$ 70 milhões, lançada pelo Grupo Genial no final de 2023, trouxe à tona um tema delicado e controverso: a relação entre o mercado financeiro e o desmatamento ilegal na Amazônia. O prospecto desses títulos, obtido pela Repórter Brasil, revela que parte dos potenciais beneficiários inclui produtores autuados por irregularidades ambientais, expondo falhas regulatórias e levantando questionamentos sobre a responsabilidade de investidores e instituições financeiras.

O mercado de CRAs e os beneficiários ligados ao desmatamento

Os CRAs são instrumentos financeiros usados para captar recursos para o agronegócio, oferecendo atrativos como isenção de Imposto de Renda e alta rentabilidade. Porém, a investigação revelou que entre os 37 potenciais beneficiários listados no prospecto, constam produtores rurais com histórico de desmatamento ilegal e propriedades sobrepostas a unidades de conservação ambiental. Exemplos emblemáticos incluem a Fazenda Bianchin e a Fazenda São Francisco de Assis, ambas com múltiplos embargos ambientais e ações judiciais em curso.

Mesmo diante desses casos, o Banco Genial afirma que a lista de beneficiários do prospecto tem caráter “indicativo e não vinculante”. No entanto, especialistas como Maria Eduarda Senna Mury, da organização Harvest, apontam que o problema está na pulverização de responsabilidades entre bancos, securitizadoras e investidores. Esse modelo dificulta o rastreamento das propriedades envolvidas e permite que áreas embargadas continuem gerando receitas sem plena transparência.

Impactos ambientais e a fragilidade regulatória

No Brasil, o Banco Central proíbe o crédito rural para propriedades com embargos ambientais, mas essa regra não se aplica aos títulos privados, como os CRAs, regulados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A ausência de critérios claros e rigorosos para assegurar a regularidade ambiental de títulos emitidos representa um ponto crítico.

Tasso Azevedo, do Mapbiomas, sugere que uma solução seria vincular obrigatoriamente o Cadastro Ambiental Rural (CAR) à emissão de CRAs, garantindo que somente propriedades sem irregularidades possam captar recursos. Já Maria Mury propõe que a CVM implemente regulamentos mais robustos, adaptando diretrizes do Banco Central ao mercado de capitais.

Casos emblemáticos: desmatamento e unidades de conservação

Entre os beneficiários listados no prospecto, casos como o da Fazenda Bianchin e da Fazenda São Francisco de Assis ilustram a gravidade do problema. A primeira acumula embargos por desmatamento de quase 5 mil hectares, enquanto a segunda enfrenta ações judiciais por supressão de vegetação em áreas protegidas. Esses exemplos refletem como a falta de regulação clara permite que infratores ambientais continuem acessando recursos financeiros, minando esforços de conservação e combate ao desmatamento.

Transparência e responsabilidade no mercado financeiro

A conexão entre investidores da Faria Lima e infratores ambientais da Amazônia revela uma desconexão preocupante entre os mercados financeiros e os princípios de sustentabilidade. A regulação atual falha em garantir que recursos do agronegócio sejam direcionados apenas para práticas legais e sustentáveis, deixando brechas para o financiamento de atividades que comprometem o meio ambiente.

Conclusão: o futuro dos CRAs e a proteção ambiental

O caso dos CRAs vinculados ao desmatamento evidencia a necessidade urgente de uma regulamentação mais rigorosa e transparente. A vinculação ao Cadastro Ambiental Rural, a fiscalização mais efetiva e o compromisso de investidores com critérios ESG (ambiental, social e governança) são passos essenciais para evitar que recursos financeiros contribuam para a destruição da Amazônia. Enquanto isso, o mercado financeiro brasileiro enfrenta o desafio de equilibrar atratividade econômica e responsabilidade socioambiental.