Haitianos enfrentam o caos e luto em meio a escombros do terremoto e fortes chuvas

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Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
Moradores de Les Anglais choram os mortos após desabamento de igreja histórica

O Haiti segue mergulhado no caos depois do terremoto e diante do forte temporal provocado por uma nova tempestade tropical. Desamparados, encharcados e exaustos, os moradores não tinham outra opção que fazer as necessidades nas ruas ameaçadas pelas inundações. Na cidade de Les Cayes, mais de 200 pessoas erguiam refúgios precários em um campo de futebol inundado, sob vento e chuva persistentes.

Todas são vítimas do terremoto de 7,2 graus de magnitude no sábado, que reduziu a pó dezenas de milhares de lares em questão de segundos. Mais de 1,9 mil pessoas morreram, segundo um balanço atualizado.

Com apenas uma touca de banho para se proteger da água, Magalie Cadet está esgotada após os três dias de penúrias que acaba de suportar. “Até para fazer nossas necessidades não temos aonde ir, por isso temos que procurar fazê-las nas ruas”, lamenta esta mulher de 41 anos, com os nervos à flor da pele pelas constantes réplicas do terremoto. “Ontem à noite me refugiei perto da igreja, mas quando sentimos a terra voltar a tremer, voltei correndo para cá”, suspira.

Cerca de 6,9 mil pessoas, algumas tiradas das montanhas de escombros, ficaram feridas nos tremores. As autoridades fizeram um chamado por doações de sangue.

Ao calvário dos desabrigados que dormem ao relento se somaram os temporais da tempestade Grace nesta terça. É provável que as chuvas provoquem “grandes inundações” em algumas áreas, segundo o Centro de Furacões dos Estados Unidos, com sede em Miami.

Nestas condições, as autoridades haitianas pediram que se “intensifique a vigilância” por causa das casas com rachaduras, que poderiam acabar vindo abaixo pelo peso da chuva.

Os Estados Unidos, que evacuaram cerca de 40 pessoas para receber tratamento urgente, fretou oito helicópteros para medir o alcance da catástrofe com imagens aéreas.

O acesso à água também continua sendo muito limitado em alguns lugares, como na comuna de Pestel, onde mais de 1,8 mil cisternas estão rachadas ou foram destruídas. 

Igreja antiga destroçada

Com seu campanário e suas paredes amarelas contrastando com o céu tropical do Haiti, a Igreja da Imaculada Conceição brilhou por anos na comunidade de Les Anglais. Em poucos segundos, porém, no último sábado (14), esta joia arquitetônica construída em 1907 desabou sob o abalo de um violento terremoto. O prédio se transformou em um túmulo de escombros para os fiéis que ali estavam e faleceram.

“Tinha missa às 6h30 da manhã. Tinha acabado de celebrá-la e entrei no presbitério apenas para tomar um café antes de voltar para celebrar os batismos”, quando tudo caiu, relatou o padre Wilson Exantus André, o cura da paróquia.

Às 8h29, horário local, o terremoto reduziu toda fachada e o campanário da igreja a uma pilha de escombros em segundos. Pelo menos 17 pessoas morreram. “O mais velho dos mortos tinha 24 anos. O duro é que uma mulher que tinha dois filhos, de 18 e 3 anos, tenha perdido os dois”, lamentou o clérigo, ainda abalado.

Na paróquia da Imaculada Conceição, todos os corpos das vítimas foram retirados das ruínas. Os bancos de madeira ainda permanecem na igreja, entre as pedras que formavam o campanário. Apenas uma parte da nave e o telhado de chapa ondulada resistiram ao terremoto e às suas constantes réplicas.

“Era uma preciosa igreja com uma arquitetura belíssima. Fazia parte do patrimônio nacional, era o orgulho de Les Anglais. Aqui, a gente nunca perdia a oportunidade de falar dela, mas, em poucos segundos, esse orgulho desapareceu”, lamenta o padre.

Refúgios ao ar livre

Meses após o terrível terremoto de 2010, que custou a vida de 200 mil pessoas, a má gestão das águas residuais em uma base da ONU facilitou a propagação do cólera no país. 

Os moradores que construíam a toque de caixa os refúgios ao ar livre estavam abatidos. “Passamos muito mal a noite passada. Muito vento e depois a chuva. Fiquei sentada, as rajadas jogavam água em cima de nós”, conta Natacha Lormira, segurando numa das mãos um fino pedaço de madeira ao qual está presa uma lona rasgada.

“Não quero passar por baixo de uma galeria ou da quina de uma parede porque todos vimos gente morrer sob pedaços de paredes. Assim, nos resignamos: é melhor estar molhado do que morto”, lamenta-se.

“O Estado não faz nada”

Encharcado pela chuva contínua, Vladimir Gilles tenta fincar alguns pedaços de bambu fundo o bastante no gramado para proteger sua mulher e seu filho. “Minha casa está destruída, não tenho onde dormir. Precisamos de um lençol de plástico só para dormir no seco, mas o Estado não faz nada”, diz o jovem de 28 anos.

O primeiro-ministro Ariel Henry declarou estado de emergência durante um mês nos quatro departamentos (estados) afetados pela catástrofe. Mas o país mais pobre do Caribe enfrenta um caos político, um mês depois do assassinato de seu presidente, Jovenel Moise, que complica sua governabilidade. (AFP)

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