Morando em trailers: brasileiros enfrentam realidade dura na Inglaterra e desmistificam sonho de enriquecimento

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Em Bristol, imigrantes brasileiros compartilham desafios e desilusões da vida em trailers, com dificuldades de adaptação e promessas frustradas de prosperidade


BBC BRASIL – A realidade dos brasileiros vivendo em trailers na Inglaterra: um sonho desfeito

O estacionamento a céu aberto em Bristol, na Inglaterra, abriga uma comunidade peculiar de imigrantes brasileiros que, em busca de uma vida melhor, se depararam com uma realidade dura e distante dos sonhos iniciais. Entre eles está Célia Costa, uma goiana de 45 anos que vive em um trailer com condições básicas, longe do conforto de uma moradia tradicional. Como muitos imigrantes, ela trocou o Brasil pelo Reino Unido com o desejo de conquistar uma vida financeiramente estável, mas acabou encontrando desafios inesperados.

O custo alto de um sonho

A promessa de melhores salários e qualidade de vida levou Célia e outros brasileiros a abandonarem tudo para tentar a sorte em terras estrangeiras. Inicialmente, ela e sua família se estabeleceram na casa da filha, casada com um britânico. No entanto, após um tempo, cada um seguiu seu caminho, e a realidade se tornou mais complexa. “Achei que em questão de meses estaria rica”, relembra Célia, que hoje vive em um trailer e realiza trabalhos temporários para garantir o sustento.

imagem mostra trailer de Lucas
Interior do trailer de Lucas

A crise econômica no Reino Unido e a alta dos aluguéis, agravada em 2022 e 2023, forçaram muitos imigrantes a buscar alternativas de moradia. Em Bristol, os preços dispararam, e a cidade se tornou uma das mais caras para alugar, com valores ultrapassando o salário mínimo. Para muitos, como Célia, a única opção foi adquirir um trailer e viver nele, uma situação que, na prática, os coloca como sem-teto aos olhos do governo britânico.

Vida em comunidade e adaptação difícil

A comunidade de trailers é majoritariamente formada por brasileiros, muitos vindos do Norte e Nordeste, e funciona com um forte espírito de união. Lucas, um jovem de 24 anos também de Goiânia, encontrou no trailer uma sensação de liberdade que nunca teve dividindo quartos alugados. “Aqui, vim direto para o trailer, comprei o meu. É uma alternativa que não vou abandonar”, afirma. A falta de aquecimento e as condições limitadas para higiene pessoal, como a ausência de chuveiro, são superadas com visitas à casa de parentes ou ao uso de academias locais.

Célia Campos na comunidade de tailers
Célia afirma já ter feito turno de 18 horas trabalhando com entregas de alimentos

No entanto, os desafios vão além das dificuldades físicas. Muitos enfrentam jornadas exaustivas em empregos de entrega e limpeza, trabalhando até 18 horas diárias. “A gente trabalha como condenado”, desabafa Célia, relembrando dias em que parava a moto no meio-fio e chorava de exaustão.

Ilusão do enriquecimento e realidade desafiadora

Célia e Lucas, como tantos outros, refletem sobre o que chamam de “ilusão” de uma vida próspera no exterior. Para Célia, a conversão da libra para o real atrai muitos brasileiros, mas os altos custos no país, a falta de estabilidade e a rotina exaustiva fazem muitos reconsiderarem a decisão. “Eu não recomendaria a ninguém sair do Brasil com esse sonho de enriquecer”, afirma, categórica. Muitos dos imigrantes que ela conheceu venderam tudo no Brasil e voltaram em situação financeira pior do que antes.

O preço da distância e os laços com o Brasil

Apesar das dificuldades, tanto Célia quanto Lucas preferem não retornar ao Brasil, valorizando a possibilidade de pequenas conquistas, como ter um carro ou consumir produtos de maior qualidade. No entanto, ambos reconhecem o preço emocional e físico desse estilo de vida. “Você acaba perdendo o convívio com quem ama”, reflete Célia, que sente falta do calor familiar e das pequenas alegrias de sua vida em Goiânia.

Enquanto se ajustam à vida nos trailers, esses brasileiros não deixam de ajudar uns aos outros. Com apoio mútuo, tentam transformar o cotidiano em um país estrangeiro em uma experiência mais humana, ainda que marcada pelas frustrações e pela saudade.


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