Novo Ensino Médio aumenta desigualdade e prejudica alunos pobres, aponta pesquisa

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Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
Estudo assinado por pesquisadores da UFABC, Unifesp e IFSP mostra que nova prática piora as condições de escolarização dos mais carentes no estado de SP

O estudo “Novo Ensino Médio e indução de desigualdades escolares na rede estadual de São Paulo” aponta que a implementação do “Novo Ensino Médio” no Brasil, cujo governo comemora o pioneirismo, apesenta uma série de problemas. O trabalho foi divulgado por meio de uma Nota Técnica da Rede Escola Pública e Universidade (REPU) e está disponível aqui.

A reforma curricular conhecida como “Novo Ensino Médio” estabeleceu uma estrutura curricular que elimina as disciplinas escolares a partir do 2º ano do Ensino Médio, substituindo-as por itinerários formativos que seriam, em tese, escolhidos pelos estudantes.

Os itinerários formativos representam um conjunto de disciplinas, projetos e oficinas que os estudantes podem escolher de acordo com seus interesses, aptidões e projetos de vida.

O novo estudo comparou as escolhas dos estudantes, registradas por intermédio de um questionário online de manifestação de interesse disponibilizado pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP), com a oferta efetiva dos itinerários nas escolas.

O resultado confirmou as previsões de inúmeros especialistas em educação críticos à Reforma do Ensino Médio, pois indica que a possibilidade de os estudantes, efetivamente, escolherem as suas trajetórias escolares é muito baixa.

Ana Paula Corti, doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) e professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), é uma das autoras do estudo.

Ela explica que “a metodologia utilizada pela Seduc-SP para a escolha dos estudantes foi inadequada: a realização de uma enquete online durante a pandemia e a partir de um instrumento de consulta extenso, inviabilizou o acesso dos estudantes a informações qualificadas para uma escolha realmente embasada sobre os itinerários formativos”.

Além disso, segundo ela, a obrigação de escolher um número grande de itinerários – quando, na verdade, os estudantes poderiam cursar somente um deles – provocou uma distribuição homogênea das “escolhas” na enquete, legitimando qualquer decisão possível a respeito da oferta dos itinerários nas escolas.

As análises também mostram que a variedade de itinerários formativos oferecidos depende muito mais das condições materiais das escolas (salas de aula disponíveis, equipes docentes) e de fatores relacionados à gestão escolar, do que da escolha individual dos estudantes.

Segundo o estudo, na prática, 1.327 escolas de Ensino Médio da rede estadual (35,9% do total) vêm oferecendo somente dois itinerários formativos para o 2º ano, o mínimo exigido pela Seduc-SP. Destas, 71,7% (25,7% do total da rede) oferecem exatamente os mesmos dois itinerários.

Portanto, a “liberdade de escolha” é especialmente menor nos 334 municípios paulistas que possuem uma única escola pública de Ensino Médio (51,8% dos 645 municípios do estado). Nestes, 50,3% das escolas possuem apenas dois itinerários formativos à escolha dos estudantes.

O estudo revela, ainda, um dado preocupante a respeito da distribuição da “liberdade de escolha” entre escolas com diferentes perfis socioeconômicos.

Estudantes com renda média e escolaridade da família mais elevadas têm, em geral, maior possibilidade de escolha de trajetórias escolares em comparação a estudantes mais pobres.

Débora Goulart, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que também fez parte da equipe responsável pelo estudo, comenta que “a retirada das disciplinas e a introdução dos itinerários formativos ampliaram as desigualdades escolares na rede estadual, oferecendo menos para os que mais precisam”.

Pesquisa conclui que mudanças tornaram Ensino Médio menos atrativo

Dois meses após o início do ano letivo, 22,1% das aulas dos itinerários formativos do Ensino Médio do 1º semestre de 2022 ainda não tinham sido atribuídas a nenhum professor.

Na prática, aponta a pesquisa, é como se os estudantes tivessem um dia letivo a menos por semana por falta de professores. No caso dos alunos dos períodos vespertino e noturno, a situação é ainda mais grave: 1,5 dias de aula a menos por semana.

expansão da carga horária no Ensino Médio, outra promessa do Novo Ensino Médio aos estudantes, também foi acompanhada pelos pesquisadores.

Em 90,30% das turmas (13.314 turmas) do 1º e 2º anos da rede estadual, essa expansão está sendo feita a distância com a mesma plataforma utilizada para o ensino remoto durante a pandemia. Tanto para os estudantes do período noturno quanto nas escolas de perfil socioeconômico mais baixo, praticamente não existe expansão de carga horária presencial.

pesquisa consultou, ainda, profissionais da Educação atuantes em 28 escolas de várias partes do estado, e constatou que a grande maioria dos estudantes matriculados na expansão a distância simplesmente não acessa a plataforma oficial.

Os professores consultados compararam a atual oferta regular do Novo Ensino Médio com a precária oferta emergencial de ensino remoto durante a pandemia.

Fernando Cássio, professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), pesquisador que também assina o estudo, avalia que “a livre escolha prometida aos estudantes desde as primeiras propagandas em favor da Reforma do Ensino Médio, em 2016, serviu apenas para convencer a população de que o Novo Ensino Médio iria melhorar a qualidade da escola pública e torná-la mais atrativa aos estudantes. Na verdade, o que a pesquisa mostra é que a reforma vem piorando, significativamente, as condições dessa escola, sobretudo para os mais pobres”.

O que é a REPU

Rede Escola Pública e Universidade (REPU) envolve professores/as e pesquisadores/as de universidades públicas (UFABC, UFSCarUnicampUnifesp USP), do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP) e professores/as da rede estadual de São Paulo.

Desde 2016, a rede desenvolve estudos e pesquisas, com o objetivo de, segundo seus representantes, intervir no debate público e colaborar para a garantia do direito a uma educação de qualidade e que seja referência no aspecto social na rede estadual de ensino de São Paulo.

Voz do Pará com informações da Fórum
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