O Brasil está na contramão do debate sobre privatização, avalia David Deccache

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David Deccache alerta para os riscos de transferir serviços essenciais ao setor privado

AGÊNCIA PÚBLICA – No centro do debate atual sobre privatizações no Brasil está a recente privatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e a experiência com a Enel, empresa de energia que enfrentou críticas após falhas no fornecimento durante fortes tempestades. A visão de que a privatização traz mais eficiência e qualidade é cada vez mais contestada. O economista David Deccache, doutor em economia e especialista em finanças públicas, aponta que o país caminha na contramão global, mantendo uma política de privatização que muitos países vêm revertendo, especialmente nas áreas de saneamento e energia elétrica.

Deccache traça um panorama histórico e critica a ideia, popular nos anos 90, de que os serviços públicos seriam inerentemente ineficientes e que o setor privado traria qualidade superior. Segundo ele, as privatizações muitas vezes resultam em elevação de tarifas e redução na qualidade do serviço. “O oposto de um mau serviço público não é a privatização; é um serviço público bem prestado”, argumenta Deccache, destacando que o modelo privado prioriza lucros em detrimento do acesso universal e da qualidade dos serviços.

O contraponto global: reestatizações e o fracasso das privatizações

No cenário internacional, países como Alemanha e França já reverteram mais de 400 privatizações desde os anos 2000, movidos por experiências negativas, como o aumento de tarifas e a piora nos serviços. Em Berlim, a privatização da água gerou grandes insatisfações, levando o governo a reverter a decisão e retomar o controle sobre o serviço essencial.

Para Deccache, o Brasil enfrenta uma “assimetria de forças” nas relações regulatórias, onde grandes grupos econômicos influenciam decisões políticas e enfraquecem a fiscalização. “Empresas com poder político conseguem operar sem fiscalização rigorosa, o que compromete a eficiência e o interesse público”, alerta ele. O economista cita o exemplo do grupo Lemann, que após escândalos financeiros teve grande influência na privatização da Eletrobras, levantando preocupações sobre a capacidade do setor público de regular esses conglomerados.

Consequências das privatizações para o futuro e o interesse público

A crescente dependência do setor privado em áreas críticas, como saneamento e energia, pode também dificultar a implementação de políticas públicas essenciais. Questões como a transição energética e o combate às mudanças climáticas exigem investimentos massivos, com retorno social e ambiental, que não necessariamente geram lucro financeiro. “O setor privado não investe em questões de longo prazo e sem retorno imediato, como a sustentabilidade, que é crucial para o futuro”, alerta Deccache.

O economista enfatiza a necessidade de considerar outras alternativas, como a melhoria da gestão pública e o fortalecimento das agências reguladoras, para garantir serviços de qualidade à população. Em meio à atual crise climática e econômica, Deccache defende uma reflexão mais profunda sobre o papel do Estado e das privatizações na construção de um futuro sustentável para todos.

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