Os brasileiros são a maior comunidade estrangeira, com 183 993 habitantes no país. Mas cresceu menos que as comunidades indiana e britânica
Povitar Singh, mais conhecido por Sandy, ainda tentar descobrir qual é a melhor forma de conquistar clientes para o restaurante que abriu há três meses junto à avenida de Roma, em Lisboa. Iniciou esta semana o almoço com buffet porque quem trabalha no local disse que precisa “comer bem e rápido”.
Chegou a Portugal há ano e meio e é um dos muitos indianos que escolheram o país para viver. Esta foi a comunidade que mais cresceu o ano passado e continuam a chegar. Muitos estão na lista de espera para obter o título de residência, como é o caso de Sandy.
Até 31 de agosto, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) emitidos 63.884 autorizações de residência (AR), o que representa uma diminuição de 12,6 % comparativamente aos primeiros oito meses de 2020 (72 973). Em igual período deste ano, receberam 589 pedidos de asilo (proteção internacional), menos 7,68 % que em 2020 (638). São mais 64 522 imigrantes a residir oficialmente no país, sem contar com os milhares que aguardam a sua regularização.
Este ano, os números da imigração continuam a subir, embora mais lentamente que nos anos imediatamente anteriores à covid-19. Consequências dos limites à circulação mundial com a pandemia, mas também dos atrasos na conclusão dos processos de regularização e que se agravaram. Muitos serviços fecharam a porta durante os meses de confinamento, o que aumentou a espera de um ano e meio para pelo menos dois.
Iniciar o processo é fácil, o difícil é conseguir marcar uma entrevista para apresentar o restante da documentação, o que até há um mês era feito pelo requerente e via Internet, sem respeitar a ordem de entrada dos processos. O SEF alterou a forma de marcação, começando por convocar as “declarações de interesse” apresentadas em 2017 e 2018. Este mês está previsto agendar os pedidos de 2019.
Povitar Singh entregou a documentação em junho de 2020. Mas vale destacar que, isso não o impediu de “abrir um negócio e continuar com a vida”. Explica porque escolheu Portugal para viver com a sua família, a mulher e duas filhas. “Estive aqui duas vezes, a última há dois anos, e gostei muito, é um país muito bom para os negócios. É muito fácil conseguir os documentos e não é preciso muito dinheiro para iniciar um negócio. Na Austrália [onde vivia antes] é preciso muito dinheiro. Aqui, basta querer abrir uma empresa que se consegue a licença. Também é mais fácil aos imigrantes conseguirem o título de residência”. Além disso, com a pandemia, os impostos para o comércio “são mais baratos”.
Em 2020, a comunidade indiana registou o maior crescimento entre os imigrantes, quase 40 %. Entraram para o top 10, substituindo a Guiné-Bissau. Povitar sente que os conterrâneos continuam a escolher Portugal, sobretudo pelo ambiente e a facilidade de regularização, que diz não encontrar paralelo em outros países da UE.
Destaca o ambiente e a forma como se sentem recebidos. “Estive na Alemanha, França, Suíça, Austrália, Estados Unidos e muitos outros países, não gostam de imigrantes. Aqui, somos respeitados, abri o restaurante há três meses e os vizinhos já são amigos. E as minhas filhas podem andar de metrô, na rua, por todo o lado, sem problemas”.
“Os mais pobres não emigram”
“Povitar, o Sandy, tem 42 anos e vivia com os pais e o irmão na Austrália, que deixaram a Índia há 11 anos. Visitou duas vezes Portugal, a última precisamente para avaliar a possibilidade de trabalhar por conta própria. Tem algum dinheiro, o que também lhe permite contratar um advogado e um contabilista. Sublinha que “os muito pobres não conseguem emigrar”, acontece no seu país e na generalidade. “
“Os meus pais, a minha família, têm algumas propriedades. Para se conseguir um visto, é preciso ter um rendimento anual equivalente a 32 mil/50 mil euros. Deixamos a Índia em 2010 à procura de uma oportunidade. A população é grande, não temos boas condições de saúde, para uma pessoa ser bem atendida precisa recorrer ao serviço privado. E o mesmo acontece com a educação. Em Portugal, as escolas públicas são boas”.
Sandy conta o seu percurso sem parar de sorrir, explica que a filha mais velha, Pravleen Kaur, faz 15 anos nesse dia. Foi na última quarta-feira e o restaurante fechou para a grande festa. “É uma idade especial”, diz. A segunda filha é Japneet Kaur, de 6. As duas iniciam este ano as atividades escolares no país. Pravleen recebeu duas roupas de gala para vestir nas celebrações do aniversário e não vai pensar neste dia na nova adaptação. Mas confessa que está apreensiva em relação à escola, o pai explica-lhe que também vai aprender português. Japneet brinca.
O pai e o irmão de Sandy ficaram na Austrália, ele decidiu trocar definitivamente esse país por Portugal, depois de ter viajado por vários continentes. Chegou em fevereiro de 2020, um mês antes de ter explodido a pandemia. O país entrou em confinamento, ele abriu um supermercado na zona onde reside, em Benfica. Vendeu-o a um nepalês quando teve a oportunidade de ficar com o restaurante de um amigo da sua terra natal, que teve de regressar à Índia após a morte da mãe.
O restaurante é o Kings Kitchen, que fica numa paralela à avenida de Roma. Esteve fechado enquanto os números da pandemia não paravam de aumentar. Voltou a abrir há três meses, ainda está em fase de instalação, por exemplo, vai mudar de nome. Será o Sandy”s Restaurante. “Esteve fechado um ano e há muitas coisas para mudar. Eu estou a seguir o meu sonho, sempre quis ter um restaurante”.
As opções são variadas e não apenas com gastronomia da Índia. Sandy garante que as suas chamuças são especiais, recheadas com frango e mussarela, tal como o frango assado, de caril, mas também as massas e as pizzas. “E sei fazer um bom bacalhau ou frango à Brás”, afirma.
Algumas das especialidades que vai ter no buffet ao almoço, de segunda a sexta, por 5,99. E nem vale a pena falar-lhe da máxima dos chefs: que um restaurante deve ter um cardápio reduzido. “As pessoas gostam de comida boa, que é o que fazemos. E conheço os gostos das crianças, gostam de massa, pizzas, hambúrgueres. Nesta zona, há muitas empresas, mas também famílias, tenho de fazer um cardápio que agrade a todos”.
E a sua cozinha tem gastronomia diversificada: asiática, africana e europeia. Cozinha Saikh Hamid, 59 anos, um paquistanês que viveu 39 anos na Holanda e que optou pela nacionalidade holandesa (quando migrou o seu país não permitia a dupla nacionalidade) e a mulher de Hamid, Afifá Shaikh, 40 anos, de Marrocos. Estão em Portugal há um mês. Já Sandy faz as especialidades indianas e tem aprendido pratos portugueses pela Internet, também quando janta fora, o que diz adorar.
Europeus e asiáticos
Em 2020, o SEF emitiu 118 124 novos títulos de residência, menos 8,5% que em 2019. O ano fechou com 662 095 estrangeiros a residir no país, mais 12,2 % que nos 12 meses anteriores. Mas a subida de 2018 para 2019 foi de 22,1 %. Até 31 de agosto, mais 63 884 obtiveram a AR, a que se juntam 589 refugiados. Estes últimos, vieram por sua conta ou através do Programa de Recolocação das Nações Unidas.
Os brasileiros são a maior comunidade estrangeira, com 183 993 habitantes no país. Mas cresceu menos que as comunidades indiana e britânica.
O Reino Unido subiu para o segundo lugar, superando Cabo Verde. Aliás, há naturais de vários países da UE a optar pelo sul da Europa, como os italianos e os franceses. Eles formam a maioria das comunidades estrangeiras, seguidos pelos africanos e imigrantes do leste europeu. Superando os oriundos de Cabo Verde, Romênia, Ucrânia e China.
Destsca-se que há muitos imigrantes conseguindo nacionalidade portuguesa, deixando de constar das estatísticas nacionais dos residentes estrangeiros. Mas, os naturais da Índia também estão no top 10 da lista dos novos portugueses e continuam a subir em termos de títulos de residência. A lista dos novos portugueses é liderada pelos brasileiros e israelitas, estes últimos descendentes de judeus sefarditas portugueses, o que simplifica o processo.
O processo se complicou para os britânicos, pelo fato de deixarem de pertencer à UE. Terminou em 31 de dezembro de 2020 o período de transição. E muitos destes cidadãos optaram por emigrar do Reino Unido antes do Brexit.
Desde 1 de janeiro de 2021, os britânicos para obterem um “visto de residência estão sujeitos ao mesmo regime dos demais países (Lei 23/2007 de 04.07). Têm de ter de visto de residência válido, concedido para uma das finalidades desde que esteja em Portugal: possua prova de ter meios meios de subsistência; alojamento; esteja inscrito na seguridade social; não ter sido condenado por crime que em Portugal, e não ter sido punido com pena de prisão superior a um ano, esclarece o SEF.
Fonte: DN