Suicídio cívico

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Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
A liberdade precede todos os direitos, sendo por isso mesmo o bem maior do espírito humano

As manifestações bolsonaristas ocorridas no sábado passado, 1º de Maio, lembram o epílogo do filme O fantasma da liberdade, do cineasta espanhol Luis Buñuel. A cena icônica mostra avestruzes num zoo, tendo ao fundo gritos de “abaixo a liberdade”. Trata-se de uma crítica aos franquistas da época e àqueles que apoiam ditaduras. Afinal, a liberdade precede todos os direitos, sendo por isso mesmo o bem maior do espírito humano.

Num regime democrático, todo mundo é livre para eleger e apoiar o político que bem entender. Também é lícito a todos protestar contra aqueles que não correspondam às suas expectativas ou que cometam crimes em prejuízo da coletividade. Por tudo isso, não dá para entender cidadãos que saem às ruas exigindo o fim da democracia. O nome disso é suicídio cívico.

Manifestações pró-Bolsonaro pedem intervenção na Paulista

A história nos ensina que povos que admitem ditaduras quase sempre pagam caro pelo autoengano. As trajetórias do nazismo na Alemanha e do stalinismo, na antiga União Soviética, são os exemplos mais contundentes dessa realidade. Os dois regimes prometiam a salvação. No entanto, resultaram em repressão, perseguições, guerras e extermínio em massa.

As ovelhas e o lobo

Aqueles que entregam o país à sanha de um ditador agem como ovelhas que delegam ao lobo o dever de protegê-las. Quem melhor metaforizou o tema foi o escritor e jornalista inglês George Orwell, na fábula A revolução dos bichos. O autor narra uma rebelião de animais contra o dono de uma granja, na qual um porco velhaco assume a liderança, vira ditador e, no final, se transforma num homem pior que o antigo proprietário.

Os personagens são bichos simplórios e ingênuos, incapazes de suspeitar daquele que prometia guiá-los a um futuro melhor, mais animal e menos humano. Em pleno século XXI, surpreende o fato de pessoas escolarizadas aderirem ao discurso neofascista, acreditando em teorias conspiratórias e em promessas de salvação da pátria por um falso Messias – cujo único milagre foi multiplicar os bens da família com a prática de peculato.

Na verdade, as manifestações de sábado foram atos de desespero, motivados pela CPI da Covid-19 e pela anulação das penas do ex-presidente Lula por parte do STF (uma decisão questionável, sem dúvida). Por colocar em risco a reeleição de Jair Bolsonaro, esses dois eventos aumentaram o ódio de seus seguidores contra as instituições democráticas.

O ovo da serpente

Quem defende a volta da ditadura deveria contextualizar os fatos. Se o movimento civil-militar de 1964 ocorreu em plena guerra fria e com apoio norte-americano, um golpe nos dias de hoje resultaria num isolamento internacional sem precedentes. No primeiro momento, teríamos um banho de sangue. Em seguida, viriam os expurgos, o caos e o desgoverno.  

Para aqueles que afirmam que o Brasil jamais será uma Venezuela, convém lembrar que a estratégia miliciana de Bolsonaro é a mesma de Hugo Chávez. A diferença é de ordem ideológica. Caso ele imponha o arbítrio, dificilmente será apoiado pelo Mercosul, União Europeia, Rússia, China e, menos ainda, pelos Estados Unidos governados por Joe Biden.

Sob o comando de um ditador desde sempre antipatizado lá fora, o Brasil perderia seus maiores parceiros econômicos. Num mundo cada vez mais globalizado e interdependente, ficaríamos literalmente ilhados na contramão da História. Contudo, o ovo da serpente está na chocadeira. Oxalá a nação desperte a tempo de impedir sua eclosão.

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