Tragédias anunciadas: urgente interromper a guerra contra a natureza

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Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
Natureza explorada! Quanto vale uma vida? O início de 2022 revela, mais uma vez, o lucro é o que mais importa

Tempestades de chuva e granizo, nevascas, terremotos e maremotos; furacões, secas, inundações, desabamentos de rochas e encostas são fenômenos naturais. Fazem parte da geodinâmica terrestre. As vezes necessários para a renovação do ecossistema. Alguns são imprevisíveis. Mas com tanto avanço tecnológico por que são cada vez mais comuns?

Nem todos são acidentes naturais. São tragédias anunciadas. Esquartejada “a natureza grita apavorante” (Carlos Drummond de Andrade). Não a escutamos. Ouvimos apenas a voz do “progresso”. Natureza explorada! Quanto vale uma vida? O início de 2022 revela, mais uma vez, o lucro é o que mais importa.

As 10 vidas de Capitólio e tantas outras perdidas em meio aos desastres, ditos naturais, logo serão esquecidas. Quem se lembra das mortes causadas pela Samarco, e as vidas levadas pela barragem da Vale? Apenas as vítimas, que tudo perderam.

As chuvas intensas em Minas Gerais põem a nu a tragédia da mineração. O estado tem 39 barragens em estado de emergência. Mesmo com as centenas de mortes em Mariana e Brumadinho, quase nada foi feito para evitar novos crimes-tragédias. Pelo contrário, em 2019, seis meses depois do crime da Vale, o IBAMA aprovou um projeto de mineração – de uma empresa sediada na China – com barragens de dejetos 90 vezes maiores que a de Brumadinho, no norte de Minas. Represas da morte.

As coisas vão de mal a pior. Acionistas de mineradoras tem sangue nas mãos. Não se importam com a vida, só querem ganhar dinheiro. A mineração mata! “Eu vejo a serra do Curral descendo estrada dentro de um caminhão” (Maurício Tizumba).

A descoberta do ouro no final do século XVII reconfigurou o cenário ambiental e político das Minas Gerais e de muitas outras regiões. Rios, montanhas e florestas destruídas. De lá para cá nada mudou economicamente. A ganância pelo vil metal ainda provoca conflitos, guerras, mortes e violência. Políticos, empresários e investidores sem escrúpulos. A ganancia tudo destrói. Um crime atrás do outro: Sim, culpados existem.

O capitalismo converte tudo em mercadoria. O “mar de Minas” (Lago de Furnas) sofre um turismo extremamente predatório. O desastre de Capitólio revela um novo tipo de exploração da natureza. O turismo empresarial. As potencialidades turísticas e seus empreendimentos “sustentáveis”. Essa foi uma das pautas durante o Seminário Nacional de Governança para o Turismo em Capitólio, em 2019. La estavam cerca de 450 pessoas, entre empresários, prefeitos, senadores, deputados, secretários de turismo e representantes de organizações e institutos ligados ao turismo, como Embratur, ICMBio, (Sebrae) e Caixa Econômica Federal.

No evento, organizado pela Confederação Nacional de Municípios (CNM) “um empreendimento grandioso que terá um investimento inicial de R$ 135 milhões, gerará cerca de 1.200 empregos diretos quando estiver em pleno funcionamento e que, certamente, colocará Capitólio num outro patamar como destino turístico”, foi anunciado por Jorge Abukater, Sócio CEO da Canyons de Minas (https://brasilturis.com.br/novos-empreendimentos-no-capitolio-instigam-a-atividade-turistica/)

Nunca houve estudo geológico nem investimentos em pesquisas sobre os paredões do Canyon. O projeto fica exatamente na área do “Mirante dos Canyons” de onde desprendeu a rocha que vitimou 10 pessoas. O que são 10 vidas diante de milhões de reais? O capitalismo mata!

Todos temos algum grau de responsabilidade diante das tragédias. A começar pelo Estado. Mas nós somos consumidores de empreendimentos e de produtos devastadores da natureza. Responsabilidade política: Continuamos escolhendo governantes e políticos corruptos patrocinados por essas empresas e seus interesses escusos.

Deixamos a “boiada passar” faz tempo. Não cobramos dos governos políticas públicas, não fiscalizamos. Licenciamentos irresponsáveis muitas vezes envolvem corrupção. Uma hora ou outra a conta chega. Em Minas Gerais essa conta já chegou e tem sido muito alta. Milhares de inocentes soterrados pelo poder do dinheiro.

“Economia que mata e descarta” (Papa Francisco). É preciso interromper a guerra contra a natureza. É urgente mudar essa economia. O capitalismo é sistema criminoso de acumulação de riquezas às custas da destruição da natureza e do sofrimento dos pobres.

“A falta de reações diante destes dramas dos nossos irmãos e irmãs é um sinal da perda do sentido de responsabilidade pelos nossos semelhantes, sobre o qual se funda toda a sociedade civil […]. A destruição de todo o fundamento da vida social acaba por colocar-nos uns contra os outros na defesa dos próprios interesses, provoca o despertar de novas formas de violência e crueldade e impede o desenvolvimento duma verdadeira cultura do cuidado do meio ambiente (Laudato Si’25, 229)”.

“Cultivar e guardar a criação” (Gn 2,15) é responsabilidade nossa. Se a sociedade não reagir, não haverá “feliz ano novo”.

por Élio Gasda | Dom Total

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