Ex-presidente concede entrevista polêmica, elogia Trump e levanta questões sobre seu papel na política atual e futuro
Em recente entrevista à Folha de S. Paulo, o ex-presidente Jair Bolsonaro expressou mais uma vez sua admiração por Donald Trump e teceu comentários contundentes sobre a política americana, o cenário brasileiro e até sobre a sua própria situação jurídica. Bolsonaro abordou temas variados, da “democracia de Trump” à sua vontade de comparecer à possível posse de Trump em janeiro, caso o ex-presidente americano retorne ao poder. Nas entrelinhas, Bolsonaro constrói uma narrativa que reflete tanto sua visão de liberdade quanto seu complexo de “vira-lata”, como Nelson Rodrigues costumava definir o sentimento de inferioridade brasileira em relação aos EUA.
Bolsonaro celebra eleição de Trump como “sinal de liberdade” – julga que o presidente dos Estados Unidos vai livrá-lo da cadeia
Em um tom que beira o reverente, Bolsonaro afirmou que a eleição de Donald Trump representa um avanço para a liberdade mundial e declarou que a presença do bilionário Elon Musk ao lado de Trump já comprova isso. Para Bolsonaro, o alinhamento de Musk com Trump é um indicativo de que ambos desejam expandir a democracia globalmente. “Vimos as declarações do Trump sobre deportações e até medidas radicais contra migrantes. Isso é, para ele, a mais pura expressão democrática”, ironizou o ex-presidente, reforçando a admiração pela retórica conservadora de Trump.
A referência à presença de Elon Musk ao lado de Trump reflete o fascínio de Bolsonaro por figuras empresariais e tecnológicas de grande influência. Apesar disso, críticas têm surgido em função do uso de redes sociais, como o X (antigo Twitter), de propriedade de Musk, para impulsionar conteúdos considerados tendenciosos e até falsos. A tentativa de Bolsonaro de associar essas figuras com a ideia de liberdade e democracia, no entanto, revela uma contradição notável.
Um complexo de inferioridade à brasileira
A entrevista de Bolsonaro revelou também um “complexo de vira-lata”, expressão popularizada pelo dramaturgo Nelson Rodrigues para designar a suposta insegurança do Brasil perante os EUA. Segundo Bolsonaro, “quase tudo o que acontece lá, acontece aqui”, evidenciando uma visão de dependência e de menoridade em relação ao poderio americano.
Bolsonaro humilha Brasil, Estados Unidos e Paraguai na mesma frase
Em uma declaração polêmica, ele celebrou o fato de ter sido o último chefe de Estado a reconhecer a vitória legítima de Joe Biden, uma admissão que reforça sua lealdade a Trump e sua indiferença à diplomacia institucional. Ao se colocar “abaixo” de Trump, Bolsonaro coloca o Brasil numa posição submissa, chegando a comparar-se ao Paraguai em relação ao Brasil, um comentário que repercutiu negativamente ao expor o país vizinho como um “aliado subalterno”.
Essa postura evidencia a dependência simbólica que Bolsonaro enxerga na relação Brasil-EUA, onde o poder americano serviria como validação para os ideais que defende.
Pedidos de passaporte e uma possível rejeição do STF
O ápice da entrevista veio quando Bolsonaro afirmou que, caso Trump vença e o convide para a cerimônia de posse, ele “peticionará o STF” para permitir sua viagem aos EUA, desafiando o sistema judiciário brasileiro a lhe conceder esse passaporte. Em tom de provocação, Bolsonaro questionou: “Será que Alexandre (de Moraes) terá coragem de dizer não para o homem mais poderoso do mundo?”, aludindo a uma possível pressão política sobre o STF.
Apesar de Bolsonaro insistir em sua inocência, os processos de investigação avançam no Brasil. A Polícia Federal deve concluir em breve novos inquéritos que podem resultar em pedidos de indiciamento, o que complicaria ainda mais sua situação jurídica. Em meio a esses processos, Bolsonaro continua a buscar aliados, nacional e internacionalmente, para legitimar suas posições e visões de mundo.
As declarações de Bolsonaro revelam uma combinação de admiração pessoal por Trump, visão distorcida de liberdade e a tentativa de criar um vínculo com o poder americano para legitimar suas ações e posições políticas. A entrevista aponta para um ex-presidente ainda influente, com uma base fiel e um partido expressivo, mas também sob constante investigação e enfrentando um cenário político que pode limitar seus próximos passos. Resta saber como essas alianças, tanto internas quanto externas, afetarão o futuro de Bolsonaro e do próprio cenário político brasileiro.