Um passeio pelas teorias do Comum

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Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
Em livro, a trajetória de uma ideia radical: da gestão coletiva dos bens comuns à “democracia da multidão”, que inspira protestos em todo o mundo contra as lógicas neoliberais. Por que, mais que um conceito, ela é convite aberto ao comunhar

No livro Além das redes de colaboração, organizado por Nelson Pretto e Sergio Amadeu da Silveira, o professor de ciência da computação da USP Imre Simon e o pesquisador Miguel Said Vieira publicaram um artigo com o sugestivo título: “Rossio não-rival”. Nele, defendem que a melhor tradução para commons seria rossio, que de acordo com o dicionário Houaiss é um terreno roçado e usufruído em comum. Na abertura do artigo, recordam que uma das grandes e importantes praças de Lisboa, hoje batizada com o nome de D. Pedro IV, chamava-se Rossio. A proposta de Simon e Vieira, naquele momento, era promover uma aproximação semântica e conceitual, afinal, a origem do termo commons remonta justamente às terras coletivas usufruídas pelas comunidades agrícolas da Idade Média no mundo anglo-saxão, ou seja, algo muito semelhante aos rossios ibéricos. Mas, rossio? Faz sentido? O objetivo do esforço empreendido pelos autores era encontrar uma forma de traduzir um termo que não encontra em português correlato ideal, o que o torna realmente difícil de assimilar. Ao fim, a ideia não ganhou muitos adeptos. Tanto que vários autores optaram por manter a expressão original em inglês, commons, um anglicismo que, a meu ver, manteve o conceito secundarizado nos debates político-culturais em português. Vieira, em sua tese de doutorado, reconheceu que o fato de rossio ser uma palavra em desuso dificultou sua adoção, e aponta que há dois termos que escapam ao estranhamento de um público mais amplo quando utilizados como correlatos de commons: comum e bens comuns.

Elas têm a vantagem de serem comparativamente mais autoexplicativas, uma vez que não requerem um conhecimento das práticas específicas a que se referem as outras expressões já mencionadas. “Comum/comuns”, no entanto, tem a desvantagem de provocar um estranhamento de outro tipo: é uma expressão bastante genérica, e provoca certa ambiguidade com o uso dessa palavra como adjetivo, com os sentidos de “usual”, “vulgar”, ou mesmo de “repetido” (1).

Vieira adotou, em seus artigos e textos, bens comuns. Neste livro, porém, embora reconheça a ambiguidade gerada pelo termo comum, que, no uso popular e corrente, remete à ideia de algo ordinário, optei por ele. Parece-me a solução que tem ganhado mais adesão entre ativistas e pesquisadores nos últimos anos, sobretudo por conta de sua utilização por pensadores da política como as duplas Hardt e Negri e Laval e Dardot, cujas obras são cada vez mais influentes, especialmente no Brasil. Ainda que o presente livro não se afilie a esse campo específico de visão sobre o comum (porque meu plano é introduzir o leitor às várias possibilidades que o termo e o conceito evocam), reafirmo o uso prioritário dessa palavra. Também porque a palavra composta bens comuns pediria seu uso permanente no plural, além de carregar uma conotação mais próxima da economia. Entendo, porém, que comum, comuns ou bens comuns podem ser utilizados, em situações distintas, como sinônimos, sem que a compreensão seja prejudicada.

Um caso feliz de acordo de tradução para commons ocorreu na Espanha – mas não em todos os países que falam o espanhol – com a adoção de procomún, embora a própria Wikipedia redirecione a busca por essa palavra para o verbete bien comunal. Para resolver o problema que aponta Vieira, cheguei a pensar em versionar procomún para o português, com a criação do termo “procomum”. Isso, no entanto, só poderia ocorrer se outros atores já tivessem feito a mesma opção, o que não é o caso. Outra palavra bastante utilizada no debate sobre o comum e de difícil tradução é commoning, que significa o processo de fazer o comum, remetendo à característica comunitária e política desse conceito. Para commoning não há uma tradução adequada que possamos considerar validada, nem mesmo no espanhol. Comunalizar, comunhar, fazer o comum, nenhuma dessas expressões me parece suficiente, mas será a elas que recorrerei, sempre seguidas do termo original em inglês, quando for necessário seu uso. Reconheço que esse debate é um pouco enfadonho, mas sem enfrentar essa dificuldade terminológica, que resulta na grande variação de usos que encontramos, ficará mais difícil compreender a sequência deste capítulo.

Introduzindo o conceito

Há um vídeo na internet, de apenas três minutos, criado pelo Gemeingüenter Germany, um coletivo alemão dedicado à defesa e promoção dos comuns, cujo conteúdo merece ser transcrito na íntegra. Seu principal mérito é explicar com clareza e simplicidade algo que muitas vezes soa demasiado abstrato: o conceito de comum. Para traduzi-lo ao português, utilizei a versão ao espanhol feita pela Guerrilla Translation:

Nossa existência depende dos recursos que não só incluem a biodiversidade, como os espaços sociais em nossas vilas, bairros e cidades, a educação, as ciências e todo o mundo digital. De fato, temos recursos suficientes para satisfazer todo mundo. Mas o mundo não é assim. Há um processo de cercamento da natureza. Os espaços sociais estão cada vez mais privatizados. O acesso à educação se converteu em um mero produto. E a liberdade do mundo digital está minguando para favorecer monopólios privados. Há quem chame isso de “direitos de uso”. É algo muito simples: reduzir o fornecimento de um bem ou serviço provoca escassez. Quem fomenta a escassez pode ganhar muito dinheiro. “É assim que as coisas são!”, dizem os que se beneficiam desse arranjo. Em princípio, tudo parece bastante razoável. Porque o raciocínio é o seguinte: o acesso irrestrito aos recursos pode levar a uma exploração desmedida. Imagine… no pasto de uma vila, todos os pastores deixam as ovelhas comerem à vontade. Mas quem vai se conformar com apenas uma ovelha se é possível obter muito mais dinheiro com dez? Se todos os pastores agissem dessa maneira, o pasto se esgotaria em muito pouco tempo. Os aldeãos perderiam seu meio de subsistência. Não é um cenário insensato, verdade? Ainda assim, as pessoas podem se comportar de outras maneiras: falando, criando regras, elas se fazem responsáveis pelo comum. E garantem sua conservação. Sabem que dependem uns dos outros. O benefício de um é o benefício de todos. Essa é a essência do comum. São comunidades que criam suas próprias regras para cuidar de seus bens comuns. Todos garantem que o comum seguirá crescendo… e para todos. Seja na natureza, na sociedade, na educação, na cultura ou na internet. É uma ideia que se pratica ao redor do mundo, dia a dia. E se nos esquecemos dessa ideia, os temas mais importantes como a educação, a saúde, as mudanças climáticas, a segurança alimentar global não terão uma solução viável (2).

Destaco uma frase: “O benefício de um é o benefício de todos. Essa é a essência do comum”. Bens comuns, como explica Vieira, “são coisas compartilhadas por uma comunidade”, mas não só isso:

um bem comum não é apenas um conjunto de recursos, de coisas; é também um produto social, uma prática. Dito de outra forma, não é só a coisa compartilhada, mas também o seu compartilhamento por uma comunidade; ou, nas palavras de Massimo De Angelis, “there is no commons without commoning”: um bem comum é simultaneamente um “substantivo” (o conjunto de bens compartilhados) e um “verbo” (a ação de compartilhar; o commoning, o “fazer comum”) (3).

Essa abordagem se aproxima muito daquilo que escreve Peter Linebaugh em seu Manifesto da Carta Magna: “Falar dos comuns como se fossem recursos naturais é no mínimo enganoso e pode chegar a ser perigoso: os comuns são uma atividade e, em qualquer caso, expressam relações sociais inseparáveis das relações com a natureza. Seria melhor conservar a palavra como verbo, como atividade, em vez de conservá-la como um nome, um substantivo” (4).

A ideia de que não há comum sem o processo de produzi-lo (“não há comum sem comunhar”) também merece nossa atenção. Porque ela reforça que o comum é um caminho, em constante movimento. Na abordagem que mais me agrada, o comum é uma soma constituída pelos bens elementares, essenciais, como o ar, a luz, os oceanos, a alimentação, os corpos, o patrimônio ambiental, mais aquilo que criamos em nosso próprio benefício, como a arte, os softwares livres, a internet, os espaços públicos das cidades, mais a gestão comunitária desses bens entre pares que se autogovernam. Dentro dessa lógica, natureza e cultura são lidas de forma simétrica. Os direitos, portanto, deixam de ser somente dos seres humanos para abarcarem também o que é não humano.

É corriqueiro ver pessoas confundirem os bens em si com um comum. Isso ocorre quando lemos que os comuns são os rios, os mares, os oceanos, as ideias. Não! Rios, mares, oceanos e ideias são rios, mares, oceanos e ideias. É apenas quando compreendemos que somos parte integrante de um fluxo socioambiental contínuo – e a partir dessa consciência passamos a cuidar ativamente de Gaia (5) como cuidamos de nossas crianças – que um rio, um mar, um oceano e nossas ideias transformam-se num comum. Como escreve David Bollier, especialista estadunidense autor de inúmeros livros e estudos sobre os comuns, entre os quais Think Like a Commoner, que foi traduzido para o espanhol por meio de uma campanha global de crowdfunding, integrando editoras independentes de vários países, “não existe uma fórmula padrão ou um modelo para criar comum, é o que nos revela qualquer análise de uma determinada comunidade” (6).

O caminho que leva ao entendimento do comum demanda força de vontade para reparar nas particularidades, para ver o potencial criativo das relações sociais e abandonar a busca de universais abstratos e certezas preconcebidas. O comunitário funciona porque as pessoas passam a conhecer e experimentar condições singulares de gestão de um recurso, e terminam dependendo umas das outras, envolvendo-se com essa floresta, ou esse lago ou aquele pedaço de terra. As relações criadas entre as pessoas e os recursos importam (7).

O comum pede a interdependência: entre as pessoas, as pessoas e os recursos, os seres humanos e o planeta, a cultura e a natureza. Exige, por isso, uma entrega de todos os envolvidos. Não há comum sem uma sólida e vibrante rede de afetos. Bollier chega até a produzir uma equação para explicar o comum, que me parece divertida:

COMUM = RECURSO + COMUNIDADE + CONJUNTO DE PROTOCOLOS (SOCIAIS)

Nesse sentido, com base nos estudos da pesquisadora e ativista Silvia Federici, há uma inter-relação fundante entre a ideia de comum e o feminismo. Muito daquilo que atualmente evocamos como comuns preservados – principalmente em sua dimensão comunitária – só assim se encontra devido à ação das mulheres ao longo da história. É o caso, por exemplo, dos modos de vida coletivos preservados nas montanhas do Peru, protegidos por aquelas que fugiram da dominação imperial e colonial. Também é o que se vê no caso das agricultoras de subsistência africanas que, conforme Federici, produzem 80% dos alimentos que a população do continente consome. E isso não ocorre só no campo, mas também nas cidades, onde muitas mulheres retomaram para si lotes públicos e passaram a semear milho e mandioca em terrenos baldios. Um processo que consiste não só em preservação, mas em retomada ativa do comum. “Como demonstrado em Caliban and the Witch, na primeira fase do desenvolvimento capitalista, as mulheres propuseram a primeira linha de defesa contra os cercamentos, tanto na Inglaterra como no ‘Novo Mundo’, e foram as defensoras mais aguerridas das culturas comunais ameaçadas pela colonização europeia.” (8)

Essas primeiras ideias que arrolo só demonstram a complexidade do conceito de comum, em sua dimensão política, econômica, cultural e existencial. Nas próximas linhas, abordo diversas outras visões em busca de um amplo panorama sobre o tema. Meu intuito aqui é o de desenvolver um passeio pelas teorias, mais descritivo que crítico-analítico. O texto talvez perca em fluência, mas com certeza ganhará em densidade e multiplicidade de vozes. Obviamente, há muitos pontos coincidentes entre os discursos que selecionei, mas também alguma divergência.

A tragédia do comum

Em 1968, o ecologista Garrett Hardin publicou na revista Science um ensaio que se tornou uma referência para a discussão sobre o comum. Seu texto intitulado “A tragédia dos comuns” (The Tragedy of the Commons), polêmico e controverso, é considerado até hoje uma referência negativa para pesquisadores e ativistas que defendem os bens comuns como uma alternativa aos modelos hegemônicos de gestão de recursos pelo mercado ou pelo Estado. A tese central de Hardin baseia-se na ideia de que os seres humanos são motivados por interesses pessoais e tendem sempre a competir para maximizar seus ganhos, em quaisquer condições.

Hardin, naquele momento, estava ocupado com o problema do crescimento populacional, e sua abordagem alarmista, em princípio, pretendia evitar que vivenciássemos a tragédia que ele descreve em seu artigo. Usando um rebanho como metáfora, um rebanho em uma terra comunal, ele vaticina que a tendência é que todos os pastores venham a explorá-lo de forma desmedida: “Cada homem está preso em um sistema que o compele a aumentar seu rebanho sem limites – num mundo que é limitado. Ruína é o destino para o qual todos os homens caminham, cada um perseguindo seu próprio interesse em uma sociedade que acredita em bens comuns livres. Comuns livres trazem ruína para todos” (9).

A única alternativa diante desse cenário, portanto, seria desenvolver dois tipos de regulação impositivos: (a) por meio da privatização daquilo que possa ser privatizado, colocando os bens comuns sob controle de um ou mais donos; ou (b) por meio de forte regulação estatal, para fazer com que economicamente seja mais custoso àquele que explora um determinado bem ser destruidor que cuidadoso. Em nenhum momento ele reconhece a possibilidade de uma determinada comunidade se unir, conscientemente, para impedir a superexploração.

A tragédia dos bens comuns quando estes consistem em um cesto de comida pode ser evitada pela privatização, ou algo da mesma modalidade. Mas o ar e as águas que nos rodeiam não podem ser cercados, por isso a tragédia dos bens comuns quando consistem em uma fossa deve ser prevenida por diferentes meios, mediante leis coercivas ou dispositivos de tributação que tornem mais barato para o poluidor tratar seus poluentes do que descarregá-los não tratados (10).

Em uma passagem de seu artigo, Hardin reconhece que o sistema de propriedade privada – com a consequente possibilidade da herança – é um modelo injusto. Para ele, no entanto, a injustiça é preferível à ruína, que seria o fim inexorável de qualquer bem comum. É essa, inclusive, a solução que ele aponta para os parques nacionais dos Estados Unidos, sugerindo que sejam privatizados (o que passou ao longo dos anos a ser uma bandeira do movimento ambientalista identificado com o conservacionismo). Para Hardin a exploração privada dos recursos se apresenta como a menos pior das possibilidades existentes. E vaticina que o comum só se justificaria em condições de baixa densidade populacional. Num planeta assombrado pelo fantasma nuclear – àquela época já eram cerca de 3,5 bilhões de seres humanos sobre a Terra e, de acordo com a divisão de populações da Organização das Nações Unidas (ONU), atualmente somos 7 bilhões, caminhando para 9 bilhões em 2050 –, o texto de Hardin contribuiu para a interpretação de que os comuns eram um arranjo inviável e subsidiou o raciocínio de que seria necessário centralizar sua gestão.

Certo é que o texto de Hardin foi tão relevante que praticamente todos os escritores e pensadores do campo do comum o tomam como referência para demarcar suas diferenças. Uma crítica recorrente é que em A tragédia dos comuns Hardin fala de bens comuns como se eles fossem a terra de ninguém, como se todo arranjo comunitário se assemelhasse a um terreno baldio onde qualquer um deposita o que bem entende sem qualquer preocupação comunitária de uso. Bollier refuta essa abordagem, dizendo que não existe comum sem comunidade que o gestione: “Um comum tem limites, regras, normas sociais e sanções contra oportunistas. Um comum necessita que haja uma comunidade disposta a atuar como guardiã rigorosa do recurso em questão. E Hardin confunde um terreno comunal com a ‘terra de ninguém’, desacreditando assim os comuns como um paradigma frustrado de gestão dos recursos” (11).

Mas o principal confronto ao modelo mental de Hardin veio da cientista política Elinor Ostrom, cujo trabalho de sistematização dos modelos de gestão de bens comuns rendeu-lhe, em 2009, um ano após a grande crise mundial do capitalismo, o prêmio de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel. O trabalho de Ostrom, a partir de seu grupo de pesquisa e da associação por ela fundada (Associação Internacional para o Estudo dos Comuns – IASC Commons), constitui o mais longevo e estruturado estudo em defesa dos comuns como alternativa à gestão privada ou exclusivamente estatal dos bens naturais, sociais e culturais. A partir de estudos de caso empíricos que confrontam os presságios de Hardin, Ostrom desenvolve os princípios (12) (design principles) para o manejo de um conjunto de recursos comuns (common pool resources – CPR). No centro de sua formulação está a ideia de que as comunidades, por meio de um sistema de auto-organização e de cooperação, fazem, ao longo dos anos, uma gestão mais eficiente dos recursos do que quando seguem as normas impositivas de algum agente exterior.

Conforme analisa Joan Subirats, para Ostrom o comum é, sobretudo, um sistema de direitos e obrigações: “A partir da acumulação e da análise de muitos casos, [Ostrom] conseguiu construir um sistema de regras institucionais e de análise que mostra como se constrói uma ecologia de relações que geram ao final mais incentivos à cooperação entre os atores do que à competição entre eles” (13).

Mas a força do pensamento de Ostrom vai muito além de seu embate com Hardin e o que ela chama de teoria convencional dos bens comuns – esta que projeta a tragédia como desfecho devido aos interesses pessoais da espécie humana. Sua vasta obra – e todo o campo de pesquisadores que ela formou – investiga a capacidade que temos de aprender a cooperar e de construir instituições e sistemas de gestão duradouros para a preservação dos comuns.

Para compreendê-la, é necessário superar certos parâmetros da economia clássica, sobretudo a dualidade Estado-empresa, estatal-privatização, e a teoria da ação racional, que se baseia no fundamento de um comportamento humano totalmente egoísta. Embora não refute plenamente essa ideia – que segundo ela pode ser útil em contextos de mercados excessivamente competitivos –, Ostrom propõe, com Janssen e Poteete, uma teoria mais ampla do comportamento humano, olhando para as mulheres e os homens como “criaturas adaptativas que tentam prosperar” (14). Como consequência dessa elaboração, defende a centralidade da confiança para que uma ação coletiva seja bem-sucedida ou malsucedida, com a consequente reciprocidade que esse ambiente de confiança propicia.

Quando usuários podem se envolver em uma negociação face a face e têm autonomia para mudar suas regras, é provável que tentem se organizar. Essa organização depende dos atributos do sistema de recursos, dos próprios usuários, que influenciam a confiança uns nos outros, e dos benefícios a serem alcançados, bem como dos custos necessários para atingi-los. Se esse empreendimento autogovernado será bem-sucedido ao longo do tempo é algo que depende do fato de as instituições criadas manterem altos níveis de confiança, bem como de condições do recurso em si. É mais provável que os usuários ou estrategistas que criam sistemas com limites bem definidos, fornecem arenas para resolução de conflitos e elaboração de políticas internas e organizam métodos para o monitoramento e a sanção à não conformidade obtenham mais sucesso ao longo do tempo (15).

Em um artigo publicado na revista Science, em 1999, intitulado Revisitando o comum: lições locais, desafios globais (16), Ostrom e colegas, trinta anos depois do texto de Hardin, explicam a formulação sobre os CPRs, atualizando também a agenda de discussão para os desafios dos bens comuns globais. A partir das lições locais e regionais, os pesquisadores defendem a necessidade de criação de instituições mundiais para gerir a biodiversidade, as mudanças climáticas e os ecossistemas vivos. E apontam as várias dificuldades de pensar o comum em escala global.

Sintetizo os pontos aqui porque continuam extremamente atuais: (1) problema de escala, afinal, estamos falando de bilhões de pessoas, o que dificulta a criação de regras partilhadas; (2) o problema da diversidade cultural, que se aprofunda com o conflito norte-sul, entre nações industrializadas ou em desenvolvimento; (3) o problema de como interligar os CPRs em escala global, uma vez que essa inter-relação é muito mais complexa do que a que existe entre os gestores de um pasto ou de uma floresta, o que dificulta o trabalho conjunto; (4) o problema da velocidade das mudanças, dado que a aceleração é progressiva e o aprenderfazendo se torna mais difícil, pois as lições passadas são cada vez menos aplicáveis; (5) o problema do consenso como regra para a escolha coletiva, que é como o sistema de diplomacia funciona, o que gera resistências e privilégios.

Observando o que ocorreu nos últimos anos, especificamente com as tentativas de acordos internacionais em torno das mudanças climáticas, veremos que as preocupações de Ostrom e sua equipe no fim dos anos 1990 eram mais que legítimas. O alerta ali pontuado permanece: “Nós temos apenas um planeta com o qual experimentar. No passado, as pessoas podiam migrar para outras fontes de recurso se cometessem um grande erro no manejo local de um CPR. Atualmente, temos menos espaço para errar em nível local, enquanto em nível global não há mais espaço para se mover.” (17)

O artigo encerra defendendo que a proteção da diversidade institucional, ou seja, a maneira como os diversos povos lidam com o comum, será tão importante para a nossa sobrevivência como espécie quanto a proteção de nossa diversidade biológica.

O comum contra o neoliberalismo

Para Subirats e Rendueles, a crise do modelo neoliberal, das “esperanças que o mundo havia depositado na globalização econômica e cultural”, bem como a insuficiência do modelo estatal-regulador ajudam a explicar a popularidade dos bens comuns entre ativistas políticos, muitos deles oriundos do pensamento de esquerda. Embora não seja “nenhuma novidade”, se lido a partir de uma chave histórica, inclusive por ser “uma realidade quase universal nas sociedades pré-industriais”, o comum, por outro lado, vem ajudando a reconstruir “o espaço de vínculos, relações e elementos que conformam o coletivo” (18). “A crise econômica e política recolocou sobre a mesa a necessidade de pensar quais são as condições sociais da mudança política, quais são os compromissos e as normas que constituem uma comunidade política. Creio que o conceito de comum é a forma como nossa contemporaneidade recoloca essa questão clássica.” (19)

A mais longeva análise sobre essa relação entre o comum e a política encontra-se na obra dos franceses Christian Laval e Pierre Dardot. Seu livro Comum: ensaio sobre a revolução no século XXI, publicado originalmente em 2014 (20), é uma extensa pesquisa que se dedica a “explorar essa significação política das lutas contemporâneas contra o neoliberalismo” (21). Os teóricos franceses afirmam que o comum surge em consonância com o processo outromundista, que tem nos dias de Ação Global do fim da década de 1990 e nos Fóruns Sociais Mundiais do início dos anos 2000 seu momento de maior expressividade política.

Para eles, não se trata de uma invenção conceitual, mas da fórmula encontrada pelos movimentos sociais de se opor à “apropriação privada de todas as esferas da sociedade, da cultura e da vida”. Não é o ressurgimento do comunismo, mas sim a “emergência de uma nova forma de se opor ao capitalismo”, superando o modelo baseado no centralismo estatal.

A defesa da “democracia real” pelos jovens espanhóis, as praças e as ruas tomadas na Turquia ou nos EUA, as primaveras no norte da África ou das noites de Paris, as marchas dos estudantes chilenos contra a universidade privada e por um sistema público de ensino, a mobilização popular na Bolívia contra a privatização das águas e por sua gestão comunitária, entre outros fenômenos, não são, no entender da dupla, “acontecimentos caóticos e aleatórios, erupções acidentais e passageiras, tumultos dispersos e sem finalidade. Essas lutas obedecem à racionalidade política do comum, são buscas coletivas de novas formas democráticas” (22). Em síntese, o comum é uma construção que se estabelece como uma “instituição política no tempo dos perigos globais que ameaçam a humanidade”. “O comum tal como o entendemos significa sobretudo o autogoverno dos seres humanos, das instituições e das regras criadas para ordenar suas relações mútuas. Está, portanto, enraizado na tradição política da democracia, em especial na experiência grega.” (23)

Importante dizer, porém, que para Laval e Dardot o comum não está restrito a pequenas unidades de trabalho e vida, mas é algo que atravessa todos os níveis do espaço social, do local ao global. Nesse sentido, o comum dá origem a um novo internacionalismo, que tem alguma relação com o socialismo associacionista do século XIX e o comunismo de conselhos do século XX. “Dito de outra maneira, trata-se de instituir politicamente a sociedade, criando em todos os setores instituições de autogoverno cuja finalidade – para além de sua racionalidade – será a produção do comum. Nem a dissolução da política na economia, nem a estatização burocrática e tirânica da economia, senão a instituição democrática da economia.” (24).

Para David Hammerstein, um dos criadores do think tank Commons Network, em entrevista para este livro, na visão neomarxista de Laval e Dardot “não existem bens que sejam comuns [por sua própria natureza e por suas qualidades intrínsecas], mas sim comuns a instituir”. Quer dizer, o ar, a água ou a biodiversidade, por exemplo, só podem ser instituídos em “algo ‘inapropriável’ pela ação social”. Hammerstein julga que isso é parte de um “preconceito antropocêntrico”, que contrapõe cultura e natureza, o “vivo e o não vivo”, afirmando assim o debate democrático como exclusividade humana. “Para eles, o desafio político e democrático do comum é passar ‘da representação à participação’, ou seja, ‘o comum’ se limita a uma democracia mais direta e descentralizada para a governança dos recursos.”

Em seu trabalho, Laval e Dardot atribuem a Michael Hardt e Antonio Negri o pioneirismo da passagem de uma visão de bens comuns (commons) para comum como um devir político. Ao longo dos anos 2000, sobretudo no livro Multidão, publicado no Brasil em 2005, Hardt e Negri desenvolveram o conceito de comum como resultante da prática biopolítica da multidão, que se constitui como uma rede “aberta e em expansão”, múltipla e disforme, ampla e plural, que age para que possamos “trabalhar e viver em comum”.

Dessa maneira, como analisa Amadeu da Silveira, não há na dupla nenhuma disposição de volta ao passado, aos comuns (commons) medievais, ou mesmo à ideia de comunidade. O que eles fazem é propor um novo ambiente de luta – o comum – no contexto do capitalismo cognitivo, que transformou definitivamente as categorias do trabalho da era industrial.

O comum que compartilhamos, na realidade, é menos descoberto do que produzido. (Relutamos em utilizar a expressão no plural os comuns [the commons] porque ela remete a espaços de partilha pré-capitalista que foram destruídos pelo advento da propriedade privada. Apesar de um tanto estranho, o comum [the common] ressalta o conteúdo filosófico do termo e deixa claro que não se trata de uma volta ao passado, mas de um novo desenvolvimento. (25)

No livro Bem-estar comum, o último da trilogia, Hardt e Negri afirmam que a “democracia da multidão”, resultado de um processo de aprendizagem das formas de autogoverno e de novas organizações sociais, só é “imaginável porque todos compartilhamos do comum e dele participamos”. Por comum, eles entendem “a riqueza comum do mundo material – o ar, a água, os frutos da terra e todas as dádivas da natureza” mais “os resultados da produção social que são necessários para a interação social e para mais produção, como os conhecimentos, as imagens, os códigos, a informação, os afetos e assim por diante”. “Esse conceito do comum não coloca a humanidade separada da natureza, seja como sua exploradora ou sua guardiã; centra-se, antes, nas práticas de interação, cuidado e coabitação num mundo comum, promovendo as formas benéficas do comum e limitando as prejudiciais.” (26)

Não resta dúvida de que os compêndios de Laval e Dardot e de Hardt e Negri exigiriam apresentação muito maior. No entanto, como especifiquei no início deste capítulo – e devido à própria natureza do livro – só temos espaço para um sobrevoo panorâmico. Em síntese, porém, como distinção ao que vimos até agora quando falamos do comum, encontramos todo um campo político sendo forjado a partir não de uma reivindicação dos commons, mas sim da possibilidade de criação política do comum como um novo conjunto de práticas que se opõe aos modelos privado e estatal de organização, os quais orientaram o pensamento à direita e à esquerda ao longo dos anos. O comum aqui se apresenta associado à luta anticapitalista, portanto, antineoliberal, e absolutamente conectado à construção de uma outra democracia possível.

Produção colaborativa baseada em bens comuns

Na virada dos anos 2000, autores estadunidenses recorreram ao conceito de commons para explicar as transformações do ecossistema cultural e comunicacional ocasionadas pela era digital. Entre eles, destaca-se o professor de direito de Harvard, Yochai Benkler. Recorro a ele para que possamos avançar sobre a compreensão do comum, agora em direção à economia.

No artigo “A economia política dos commons”, Benkler afirma que o comum é um tipo de liberdade que existe fora das restrições exigidas pelo mercado. Ou seja, seu regime de existência possui restrições diferentes de direito de propriedade, porque estabelece que “nenhuma pessoa tem o controle exclusivo do uso e da disposição de qualquer recurso particular”: “Pelo contrário, os recursos governados pela comunidade podem ser utilizados e dispostos por qualquer um entre dado número de pessoas (mais ou menos bem definido), sob regras que podem variar desde o “vale-tudo” até regras claras formalmente articuladas e efetivamente impostas” (27).

Essa teoria defende que podemos analisar os comuns a partir de dois parâmetros: se são abertos a todos ou apenas a um grupo; e se são regulados ou não. No primeiro caso, um exemplo de comum aberto é o ar. Já os pastos pré-capitalistas – tão evocados como exemplo – seriam catalogados como comuns parcialmente abertos, porque eram terras de usufruto de uma comunidade específica. Com relação à regulação, Benkler nos explica que as calçadas, ruas e rodovias são um bom exemplo de comum regulado, pois existem regras previamente estabelecidas para seu uso. Como exemplo de comum não regulado, ele cita o conhecimento científico anterior ao século XX. Ou seja, tudo aquilo que existe antes da instituição da propriedade intelectual.

Em sua obra, Benkler se dedica, sobretudo, à questão digital, especialmente porque para ele as redes, em um regime de liberdade, tendem a fortalecer o não proprietário (os commons), na contramão do que ocorria na era industrial. Nesse novo contexto os regimes baseados no comum são “sustentáveis” e provavelmente “mais eficientes que os regimes de propriedade individual”. A informação digital – elemento central de reorganização do capitalismo –, um bem público (um public good, não rival), só não flui livremente por conta das restrições estabelecidas pelas leis de propriedade intelectual. Com isso, em nome de uma velha economia, os defensores do copyright bloqueiam a força de uma produção colaborativa baseada em bens comuns (commons-based peer production – CBPP), ou seja, uma nova economia mais democrática e distributiva que a era digital nos propiciaria.

Commons significam liberdade, são espaços institucionais livres das restrições impostas pelos requisitos dos mercados. Quando se fala de um ambiente de informação, do espaço cultural e simbólico que ocupamos como indivíduos e cidadãos, a diversificação das restrições sobre as quais operamos, inclusive a criação de espaços relativamente livres das leis de estruturação de mercados, atinge o cerne da liberdade e da democracia (28).

Essa formulação econômica de Benkler vem sendo largamente utilizada por grande parte dos economistas do comum, entre os quais Michel Bauwens, criador da P2P Foundation, que aponta que a economia dos pares dá origem a um terceiro modo de produção, de governança e de propriedade (29). Para Bauwens, trata-se de uma economia que persegue o adágio “de cada um de acordo com suas capacidades; a cada um de acordo com suas necessidades”.

Não seria uma “economia da dádiva” (gift economy), mas um modelo complementar em que, em sua forma pura, os produtores não são obrigatoriamente pagos de nenhuma maneira, nem sequer com reciprocidade, mas, sim, compartilham valores. O projeto P2P Value, desenvolvido pela fundação de Bauwens, tem como objetivo construir um diretório de projetos (30) e comunidades que podem ser categorizados como CBPP. Entre os exemplos por eles citados estão projetos de software, hardware e design livres, como Linux, WordPress e Drupal, a plataforma de crowdfunding espanhola Goteo, que atua para viabilizar projetos socioculturais do comum, e a Wikipedia.

A produção colaborativa baseada em bens comuns [CBPP] pode ser definida como qualquer processo no qual indivíduos podem contribuir livre e abertamente para um comum (de conhecimento, códigos ou design), necessariamente associado a formas de governança participativa (visto que não há relação de dependência entre os contribuintes livres); e assim criar um comum de conhecimento que está aberto a novas contribuições (31).

O comum é, portanto, também uma alternativa para a reorganização do sistema produtivo em torno do cuidado e da solidariedade. A economia colaborativa impulsiona a produção social e a troca equitativa entre pares e vem sendo pavimentada por meio da atuação de empreendedores cidadãos cujo objetivo final não é a maximização do lucro, mas sim a melhoria das condições sociais de todas e todos. Novas institucionalidades, algumas recuperando e atualizando o modelo das cooperativas, apresentam-se como alternativa para viabilizar arranjos produtivos sadios, os quais se estruturam a partir de uma lógica de suficiência e não de acumulação.

Quatro entornos do comum

O pesquisador espanhol Antonio Lafuente é coordenador do Laboratório del Procomún do MediaLab-Prado, na Espanha. Ele é autor de um artigo intitulado “Os quatro entornos do Comum” (32), no qual compartilha um framework que nos ajuda a entender os atravessamentos dos bens comuns nas várias camadas de nossa existência. O quadro por ele produzido, que traduzo na sequência, versa sobre os corpos (sensibilidade e corporalidade), a natureza (biosfera, geosfera), a cidade (domésticos, culturais e urbanos) e o digital (códigos e estruturas).

Segundo Lafuente, a humanidade se estruturou em quatro meios diferentes. Em termos conceituais podemos imaginá-los como camadas que se interconectam e, como ocorre no cérebro, representam uma sucessão de adaptações a quatro distintos entornos: o corpo, a natureza, a cidade e o digital.

Em cada uma dessas dimensões travamos árduos esforços para construir o que é de domínio público e o que é de domínio privado e, mais recentemente, para nos abrirmos ao comum, uma dimensão em parte independente e em parte suporte para as outras duas. No princípio tudo era comum. Do comum foi emergindo o exclusivo e, mais tarde, desde a modernidade, especialmente a partir das revoluções liberais (do fim do século XVIII, início do século XIX), o privado e o público (33).

É possível, com base nessa formulação, antever onde podemos agir, para além do mercado e do Estado, em múltiplas dimensões – garantindo assim que entendamos o conceito do comum como multidimensional. Esta versão do diagrama possui pequenas diferenças em relação à publicada no artigo original de Lafuente e foi produzida em diálogo com seu autor. Para registrar, substituímos a palavra meio ambiente da versão anterior por natureza (34), no sentido de patrimônio (natural), afirmando assim a perspectiva simétrica natureza-cultura que subsidia nossa visão do comum.

Depois de percorrer as obras de Imre Simon, Miguel Said Vieira, Garrett Hardin, Elinor Ostrom e vários de seus pesquisadores parceiros, Christian Laval e Pierre Dardot, Michael Hardt e Antonio Negri, Silvia Federici, Michel Bauwens, Silke Helfrich, Joan Subirats e César Rendueles, Yochai Benkler, Lawrence Lessig e Antonio Lafuente, me posto diante da esfinge. Com suas asas abertas e olhos vermelhos, sentada sobre sua cauda de leoa, ela me fita à espera que eu decifre sua pergunta: afinal, o que é o comum? Peço-lhe paciência. Já avançamos bastante, mas ainda é preciso escutar outras vozes, narrar outros casos, para que possamos entender a complexidade do assunto.


Notas:

(1) Miguel S. Vieira, Os bens comuns intelectuais e a mercantilização, tese de doutorado em Educação, Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014, p. 110.

(2) “Que es el procomún?”, disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=xBtqYMXZhk8>, acesso em: 20 mar. 2018.

(3) Miguel S. Vieira, op. cit., pp. 97-8.

(4) “Hablar de los comunes como si fueran recursos naturales es como mínimo engañoso y puede llegar a ser peligroso: los comunes son una actividad y, en cualquier caso, expresan relaciones sociales inseparables de las relaciones con la naturaleza. Sería mejor conservar la palabra como verbo, como actividad, antes que como un nombre, un sustantivo.” Peter Linebaugh, El Manifiesto de la Carta Magna: comunes y libertades para el pueblo, Madri: Traficantes de Sueños, 2013, p. 285.

(5) Uso esse termo em referência à obra do livre-pensador James Lovelock, que afirma ser o planeta terra, Gaia, um organismo vivo, não uma rocha inerte como boa parte do pensamento ocidental defende. Desenvolvo melhor essa ideia no capítulo 8 deste livro, intitulado “O planeta é um comum”.

(6) David Bollier, Pensar desde los comunes: una breve introducción, Madri: Traficantes de Sueños, 2016, p. 22. Disponível em: <https://sursiendo.com/docs/Pensar_desde_los_comunes_web.pdf>, acesso em: 20 mar. 2018.

(7) “Pero el caminho que lleva al entendimiento del procomún demanda un esfuerzo de voluntad para reparar en las particularidades, para ver el potencial creativo de las relaciones sociales y abandonar la búsqueda de universales abstractos y certezas predecibles. Lo comunal funciona porque las personas llegan a conocer y a experimentar las condiciones singulares de la gestión de un recurso, y terminan dependiendo los unos de los outros, encariñandose com este bosque o ese lago o aquella parcela de tierra. Las relaciones que se crean entre las personas y sus recursos importan.” Ibidem, p.21.

(8) Silvia Federici, “O feminismo e as políticas do comum em uma era de acumulação primitiva”, in: Renata Moreno (org.), Feminismo, economia e política, São Paulo: SOF, 2014, p. 151. Disponível em: <http://www.sof.org.br/wp-content/uploads/2015/08/Economia-e-política-web.pdf>, acesso em: 19 abr. 2018.

(9) “Each man is locked into a system that compels him to increase his herd without limit – in a world that is limited. Ruin is the destination toward which all men rush, each pursuing his own best interest in a society that believes in the freedom of the commons. Freedom in a commons brings ruin to all.” Garrett Hardin, “The Tragedy of the Commons”, Science, v. 162, n. 3859, pp. 1243-8. Disponível em: <http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/downloaddoi=10.1.1.124.3859&rep=rep1&type=pdf>, acesso em: 19 abr. 2018.

(10) “The tragedy of the commons as a food basket is averted by private property, or something formally like it. But the air and waters surrounding us cannot readily be fenced, and so the tragedy of the commons as a cesspool must be prevented by different means, by coercive laws or taxing devices that make it cheaper for the polluter to treat his pollutants than to discharge them untreated.” Ibidem.

(11) “Un común tiene límites, reglas, normas sociales y sanciones contra los oportunistas. Un común necesita que haya una comunidad dispuesta a actuar cual guardián riguroso del recurso en concreto. Y Hardin confunde un terreno comunal com la ‘tierra de nadie’, desacreditando así a los comunes como un paradigma frustrado de gestión de los recursos”. David Bollier, op. cit., p. 31.

(12) Os oito princípios de Ostrom são: (1) fronteiras bem definidas; (2) coerência entre as regras de apropriação e provisão com as condições locais; (3) arranjos de decisão coletiva; (4) monitoramento; (5) sanções graduais; (6) mecanismos de resolução de conflitos; (7) reconhecimento mínimo de direitos de organização; e (8) alinhamento e articulação intersetorial na gestão.

(13) “A partir de la acumulación y del análisis de muchísimos casos, logró construir un sistema de reglas institucionales y de análisis que muestra cómo se construye una ecología de relaciones que generan a la postre más incentivos a la cooperación entre acotres que a la competencia entre ellos.” César Rendueles; Joan Subirats, Los (bienes) comunes: oportunidad o espejismo?, Madri: Icaria, 2017, p. 31.

(14) Ami R. Poteete; Elinor Ostrom; Marco Janssen, Trabalho em parceria: ação coletiva, bens comuns e múltiplos métodos, São Paulo: Editora Senac, 2011, p. 288.

(15) Ibidem, p. 317.

(16) Elinor Ostrom et al., “Revisiting the Commons: Local Lessons, Global Challenges”, Science, v. 284, n. 5412, 9 abr. 1999, pp. 278-82. Disponível em: <http://science.sciencemag.org/content/284/5412/278.full>, acesso em: 13 jul. 2017.

(17) “We have only one globe with which to experiment. Historically, people could migrate to other resources if they made a major error in managing a local CPR. Today, we have less leeway for mistakes at the local level, while at the global level there is no place to move.” Ibidem.

(18) César Rendueles; Joan Subirats, op. cit., pp. 10-6.

(19) “La crisis económica y política ha vuelto a poner sobre la mesa la necesidad de pensar cuáles son las condiciones sociales del cambio político, cuáles son los compromisos y las normas que constituyen una comunidad política. Creo que el concepto de los comunes es la forma en que nuestra contemporaneidad se está planteando esta cuestión clásica.” Ibidem, p. 11.

(20) A tradução para o português foi lançada em 2017, pela editora Boitempo.

(21) Christian Laval; Pierre Dardot, Común: ensayo sobre la revolución en el siglo XXI, Barcelona: Gedisa, 2015, p. 25.

(22) Ibidem, p. 24.

(23) “Lo común tal como aquí lo entendemos significa ante todo el autogobierno de los seres humanos, de las instituciones y de las reglas que se dan para ordenar sus relaciones mutuas. Está pues enraizado en la tradición política de la democracia, en especial en la experiencia griega.” Ibidem, p. 519.

(24) “Dicho de otra manera, se trata de instituir políticamente la sociedad, creando em todos los sectores instituciones de autogobierno cuya finalidad – además de sua racionalidad – será la producción de lo común. Ni la disolución de la política en la economía, ni la estatización burocrática y tiránica de la economía, sino la institución democrática de la economía.” Ibidem, p. 523.

(25) Michael Hardt; Antonio Negri, Multidão: guerra e democracia na era do Império, Rio de Janeiro: Record, 2005, p. 14.

(26) IdemBem-estar comum, Rio de Janeiro: Record, 2016, p. 8.

(27) Yochai Benkler, “A economia política dos commons”, in: Sergio Amadeu da Silveira (org.), A comunicação digital e a construção dos commons: redes virais, espectro aberto e as novas possibilidades de regulação, São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2007, p. 13.

(28) Ibidem, p. 16.

(29) Cf. Michel Bauwens, “The Political Economy of Peer Production”, CTHEORY. Disponível em: <https://journals.uvic.ca/index.php/ctheory/article/view/14464/5306>, acesso em: 20 abr. 2018.

(30) Disponível em: <http://directory.p2pvalue.eu/>, acesso em: 20 abr. 2018.

(31) “Commons-oriented peer production can be defined as any process whereby individuals can freely and openly contribute to a common pool (of knowledge, code, and design), necessarily coupled to forms of participatory governance (since there is no relation of dependence between free contributors); and thereby create a common pool of knowledge that is itself open to new contributions.” Michel Bauwens, “Commons based peer production: an introduction”, 8 jul. 2014, Heinrich Böll Stiftung. Disponível em: <https://www.boell.de/en/2014/07/08/commons-based-peer-production-introduction>, acesso em: 14 jul. 2017.

(32) “Los cuatro entornos del procomún”, disponível em: <http://digital.csic.es/bitstream/10261/2746/cuatro_entornos_procomun.pdf>, acesso em: 23 maio 2018.

(33) Idem.

(34) Comentário de Lafuente para esta tradução, em mensagem enviada ao autor: “Mas o que é o natural? A primeira definição, a que se usou durante a modernidade (especialmente com a chegada da ciência experimental), é que o natural é o que não é social, político, cultural… melhor dizendo, o que existe sem intervenção humana. Mas, de fato, só existe o que sabemos ver e o que sabemos nomear. Ou, em outras palavras, o que pudemos tornar nosso pela via da ciência e da tecnologia. O que quero dizer? Ou, dito de outro modo, qual é o modo de existência que têm os objetos naturais? O ar não é uma coisa senão um objeto que foi se transformando com o tempo em função de como foram avançando nossos conhecimentos de química, nossos instrumentos de medida, nossas formas de legitimação do saber… ou seja, isso que chamamos natureza tampouco é à margem de mim, senão que está relacionada com minhas máquinas, meus conceitos, minhas instituições. Dito de outra forma: disso que se chama natureza, só estou evocando essa parte de que sei falar, de que posso falar, de que quero falar, sobre a qual posso legislar (mais Newton ou mais Montesquieu). Por isso, ainda que o entorno se chame natural, nessa explicação creio que se entende melhor quando o faz sinônimo de patrimônio (natural)”.

O texto acima é o capítulo 2 de: O Comum entre nós: da cultura digital à democracia do século XXI De Rodrigo Savazoni, pelas Edições SESC

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