O imenso atraso rodoviarista do Brasil

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Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
95% de toda a energia usada em transporte no país é consumida pelo modal rodoviário, o sistema menos eficiente. O metrô requer a quantidade gasta para mover uma bicicleta; o trem, campeão de eficiência, 12 vezes menos que um caminhão…

Optar por veículos mais eficientes é uma escolha racional, tanto para economizar energia quanto para diminuir as emissões de gases poluentes. É possível comparar a eficiência de diferentes meios de transporte usando o conceito de intensidade energética: a razão entre o consumo de energia para cada quilômetro percorrido e a quantidade de passageiros a bordo. Nesse quesito, os carros estão entre as opções menos eficientes de transporte. O automóvel mais vendido no Brasil, por exemplo, gasta 2 megajoules de energia por quilômetro para transportar um passageiro – 63 vezes a quantidade de energia usada por uma bicicleta elétrica para fazer o mesmo trajeto (cerca de 0,03 megajoule). Os modelos luxuosos tampouco são mais eficientes: para fazer o transporte de um único passageiro, uma Bugatti Veyron – um dos carros mais caros do mundo – usa a mesma quantidade de energia de 175 patinetes elétricos. Quando se trata de transporte de carga, nada supera a eficiência dos trens, que precisam de 0,22 megajoule por quilômetro para transportar 1 tonelada de carga. Um caminhão consome 12 vezes essa quantidade, 2,7 megajoules. Mas ainda que seja menos eficiente em termos de energia, o transporte rodoviário é dominante no Brasil – para cargas e pessoas. Tanto que 95% de toda a energia consumida em transporte no país é usada por veículos do modal rodoviário. Nesta semana, o =igualdades destrincha os dados de eficiência energética dos meios de transporte.

Em termos de energia, os carros estão longe de ser a opção mais inteligente. No ano passado, o automóvel mais vendido no Brasil foi o Fiat Strada. Com uma pessoa a bordo dessa picape, são necessários 2 megajoules por quilômetro para dirigir na cidade. Uma bicicleta elétrica, por outro lado, precisaria de apenas 0,0315 megajoules para fazer o mesmo trajeto, levando em conta um motor padrão de 36 volts. Isso significa que a energia usada para transportar uma pessoa em uma picape equivale à de 63 bicicletas elétricas.

Automóveis mais sofisticados tampouco são mais eficientes quando o assunto é consumo de energia. Uma  Bugatti Veyron, um dos automóveis mais rápidos e caros do mundo, precisa de 7 megajoules por quilômetro para transportar um passageiro. Esse modelo de automóvel custa cerca de 10 milhões de reais. Um patinete elétrico padrão da marca Xiaomi, que custa em torno de 3 mil reais, consome 0,04 megajoules para fazer o mesmo trajeto. Ou seja, a energia necessária para transportar um passageiro numa Bugatti Veyron equivale à de 175 patinetes elétricos. 

Meios de transporte públicos – que transportam muitos passageiros ao mesmo tempo – conseguem uma relação mais vantajosa entre a energia necessária para o deslocamento e quantidade de pessoas a bordo. Os metrôs mais eficientes, por exemplo, usam cerca de 0,1 megajoule por passageiro a cada quilômetro percorrido. Mas veículos ainda mais simples, como uma bicicleta, são capazes de atingir essa mesma intensidade energética. Um ciclista de 64 kg pedalando uma bicicleta a 16 km/h, por exemplo, também vai precisar gastar 0,1 megajoule por quilômetro (cerca de 27 quilocalorias). Isso significa que a quantidade de energia utilizada por um ciclista equivale à usada pelo metrô para transportar cada passageiro.

Trens interurbanos de alta velocidade, usados para viagens de longa distância (trajetos de 150 a 600 quilômetros), estão entre os veículos mais eficientes para transporte de pessoas. Os modelos mais recentes – como os usados na França e na Alemanha, por exemplo – necessitam de apenas 0,2 megajoule por passageiro-quilômetro. Aviões a jato gastam dez vezes essa quantidade de energia para transportar cada passageiro.

Quando se trata de transporte de carga, nada supera a eficiência energética dos trens. Dados de 2019 da Agência Internacional de Energia mostram que o modal ferroviário precisa de 0,22 megajoule por quilômetro para transportar 1 tonelada de carga. Nas rodovias, para mover a mesma quantidade de carga, um caminhão precisa gastar 2,7 megajoules – 12 vezes o usado pelos trens. 

Ainda que seja menos eficiente, o transporte rodoviário é dominante no Brasil – tanto para carga, quanto para locomoção de pessoas. Segundo o Anuário Estatístico de Transporte de 2020, do Ministério da Infraestrutura, 95% de toda a energia consumida em transporte no Brasil corresponde apenas ao modal rodoviário – 873 milhões de megawatts-hora. Isso é dez vezes a energia gerada na usina de Itaipu em um ano.

Optar por meios de transporte mais eficientes, com baixa intensidade energética, é a escolha mais racional. Mas não é isso que acontece no Brasil. Segundo o Anuário Estatístico de Transporte do Ministério da Infraestrutura, todo o setor de transporte consumiu uma quantidade de energia que equivale a 79 milhões de toneladas de petróleo. Isso é o triplo de toda a energia usada nas residências brasileiras em 2020.

Por Camille Lichotti e Renata Buono, na Piauí

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