Programa, criado e apresentado pelo veterano Rolando Boldrin, é o único no Brasil que abre espaço para artistas de verdade
Foi num domingo recente, assistindo ao programa Sr. Brasil, da TV Cultura, que tive a alegria de ver e ouvir a cantora Mariene de Castro. Afirmo, sem medo de errar, que é a voz mais bonita da Bahia.
Esse programa, criado e apresentado pelo veterano Rolando Boldrin, é o único no Brasil que abre espaço para artistas de verdade. Foi graças a ele que fiquei conhecendo uma pianista e cantora simplesmente maravilhosa de nome Ju Cassou. Jucelene Cassou Guimarães é uma curitibana de raro talento, que além de cantora, instrumentista e arranjadora, é também dubladora. Fico sabendo que é dela a voz da personagem Bela, na última versão do filme A Bela e a Fera. Uma das músicas que ela cantou, acompanhando-se ao piano, foi o Expresso 2222, de Gilberto Gil, num arranjo dela que deve ter deixado Gil maravilhado. Como o lema do programa é “Vamos tirar o Brasil da gaveta”, essa artista, Ju Cassou, saiu da gaveta e tomou lugar na galeria das minhas admirações.
Foi também no Sr. Brasil que ouvi a belíssima voz de Lívia Nestrovski cantando com acompanhamento ao violão do pai, o maestro Arthur Nestrovski. A gente ouve esses dois com a sensação de estar subindo ao Céu. Porque a voz é celestial e o violão, divino.
Em uma das reprises do programa, tive a oportunidade de ouvir, durante uma hora, músicas do Belchior, cantadas por ele mesmo ou por cantoras e cantores convidados. Um deles foi ninguém menos do que o humorista Chico Anysio, que homenageou o conterrâneo cearense cantando “Galos, noites e quintais”. Chico avisou que não era cantor, mas interpretou com emoção e terminou com um acréscimo que fez chorar Belchior na plateia: “Eu sou apenas um senhor latino-americano”.
Foi graças ao Boldrin que fiquei conhecendo um grupo vocal de altíssimo nível, chamado Ordinarius. São três mulheres e três rapazes cariocas, afinadíssimos e de harmonia insuperável. Eles brincam com as canções.
Já escrevi sobre o Sr Brasil, mas nunca é demais recomendá-lo mais uma vez neste meu despretensioso espaço concedido pela revista DomTotal. Trata-se do único programa da televisão brasileira (o único, repito) onde se pode conhecer, ver ou rever cantores, compositores e instrumentistas de verdade, do nível de Dominguinhos, Egberto Gismonti, Wagner Tiso, Vander Lee, Paulinho Pedra Azul, Tavito, Milton Nascimento, Pereira da Viola, Miltinho Edilberto, Titane. Tom Zé, Hamilton de Holanda, o insuperável Yamandu Costa e suas sete cordas mágicas, além de grupos como MPB-4, Fala Mansa e Demônios da Garoa, para citar apenas alguns dos muitos que ali já se apresentaram.
Em que outro programa de televisão você pode ouvir uma dupla de violão e bandolim, um de Jundiaí-SP e o outro de Cáli, na Colômbia, tocando choros de Ernesto Nazareh? E onde mais você pode ouvir a cantora Liv Moraes, filha de Dominguinhos, cantando acompanhada de um jovem sanfoneiro chamado Cosme Vieira, do nível de Dominguinhos? E onde mais se pode ver e ouvir a cantora Mariana Aydar, acompanhada de Mestrinho, outro mestre da sanfona e da música nordestina? Ou Mônica Salmaso acompanhada de piano ou violão?
Neste tempo de pandemia, o programa é apresentado em reprises, por ser de auditório, mas ainda assim vale a pena ver ou rever. Boldrin, que já costeia o alambrado dos noventa, criou e comanda um programa imperdível, aberto a artistas talentosíssimos que o Brasil raramente ou nunca tem oportunidade de ver na televisão. Muitos in memoriam.
Diante do exposto, renovo minha recomendação a você, meu caro amigo e minha amantíssima amiga, os votos de bons inícios de domingos na companhia de Rolando Boldrin e os notáveis artistas que ele tira da gaveta para nossa alegria.
por Afonso Barroso no Dom Total
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