Os bobos da corte da Igreja

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Evandro Oliveira
Evandro Oliveira
PÓS GRADUADO EM GESTÃO E DIREÇÃO ESCOLAR; ESPECIALISTA EM "POLÍTICAS DA IGUALDADE RACIAL NA ESCOLA", SABERES AFRICANOS E AFRO-BRASILEIROS NA AMAZÕNIA - PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ (UFPA); GRADUADO CIÊNCIAS SOCIAIS COM ÊNFASE EM SOCIOLOGIA - UFPA; ATUA COMO PROFESSOR DE FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NA REDE PÚBLICA E COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E CURSOS PRÉ-VESTIBULARES.
Enquanto eles entretem seu público, o pontificado de Francisco só cresce. Mas o choro é livre. O riso também. Imagem: ‘Buffone di Corte’, de Cesare Augusto Detti (Domínio Público/Wikipedia)

O sínodo sobre a sinodalidade, que o Papa Francisco convocou, é a ‘prova de fogo’. Através de uma assembleia única, que envolve representantes da Igreja no mundo todo (clero, religiosos e laicado), o pontífice conseguirá averiguar se seu espírito de reforma conseguiu chegar aos centros e às periferias.

Embora o santo padre tenha focado numa ‘reforma da Cúria Romana’, a verdade é que a sua intenção era fazê-la urbi et orbi – de Roma para o mundo – desde o início. Do contrário, não faria sentido falar de uma “reforma do coração” ou promover uma revolução pastoral a partir das estruturas.

A ideia, na verdade, foi concebida universalmente. É mais uma tentativa de abater o clericalismo enraizado nas paróquias, nas comunidades e nas dioceses que, na visão de Francisco, é a raiz de todos os males. E não estamos falando só de padres que instrumentalizam a batina, mas também de leigos clericalizados, que se sentem os ‘alfandegários da fé’.

Mas o que impediria o sucesso desse sínodo? Existe uma maioria esmagadora contrária a esse projeto? A verdade é que não. No entanto, existe uma minoria, muito barulhenta, que consegue ocupar os espaços virtuais para compartilhar suas ideias toscas sobre uma realidade que sequer dominam.

São os bobos da corte da Igreja, que fazem piruetas nas redes sociais para agradar seu público alienado. Se sentem os príncipes da Igreja, através de suas posturas soberbas e discursos pedantes, mas não passam de bufões de um império católico caricaturado. Em vez de roupas coloridas, são os efeitos visuais e o grande investimento em aparato técnico para a produção de vídeos (de)formativos que conseguem maquiar muito bem a ignorância.

O problema é que tentam frear um Papa o qual ninguém consegue parar mais. De maneira excepcional, Francisco já colhe os frutos da sua ousadia, à revelia de todas essas investidas para acabar com seu pontificado. O sinodo é a coroação de algo que já deu certo. O choro é livre. O riso também (no nosso caso).

Os próximos três anos, tempo de duração desse sínodo, serão cruciais – tanto para a Igreja quanto para os católicos em geral.

Francisco aposta muito nessa assembleia e acredita que ela será um meio para movimentar a Igreja, de modo que ela possa refletir sobre como vem sendo aplicado o Concílio Vaticano II, para além das ideologias ou das interpretações ‘partidárias’. E quem ainda estiver querendo ‘anular’ o concílio vai ter que decidir: ou se une a Roma de vez ou vai ter que procurar uma outra instituição fora da Igreja Católica.

Francisco realiza uma ‘revolução institucional’ que dificilmente seus sucessores conseguirão impedir. O papel do Papa, do bispo, do padre e dos leigos é revisto. E não é uma revolução, no melhor sentido da palavra, que visa acabar com a hierarquia, mas impulsiona cada membro da Igreja a viver da forma mais coerente possível, segundo o que é próprio da sua função. Enxergar um cargo na perspectiva do serviço, não do status.

A Igreja sequer foi concebida como uma monarquia. Isso é resquício da Idade Média, que via no poder régio a forma de governo perfeita. Era a mentalidade da época e não podemos insistir nesse anacronismo.

O Concílio Vaticano II, ao reforçar a eclesiologia do povo de Deus, retorna à própria essência do catolicismo, das primeiras comunidades cristãs, da fé popular que sustentou gerações. Em outras palavras, foi uma tentativa de romper com aquele mundanismo institucional que transformou os padres em ‘micromangements’, os bispos em príncipes e o Papa num monarca, que antepunha essa função a de vigário de Cristo.

Mas, pelo jeito, esse é o modelo ideal de Igreja na cabeça dos bobos da corte. Muita ‘teologia’ e pouca caridade. Muita estética e falta de experiência concreta com o sagrado. Muito latim, mas pouco Jesus Cristo.

por Mirticeli Medeiros para a Dom Total

O texto reflete a opinião pessoal do autor, não necessariamente do Voz do Pará. O autor assume integral e exclusivamente responsabilidade pela sua opinião.
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